Capítulo 9
Um mês depois
Alicia ouvia os sons que vinham da cozinha,
onde Bourregard deveria estar preparando o café da manhã. Porém, nem mesmo o
aroma da saborosa bebida a seduzia a abrir os olhos. Queria, não, precisava de
mais alguns minutos de sono.
Suspirou deliciada. Sentia o corpo
languido e saciado. As recordações da noite vivida nos braços dele invadiram
sua mente e os lábios se curvaram em um sorriso que Melquisedec adoraria ter
flagrado.
Hoje, fazia um mês que estavam em Paraty
Mirim. Trinta dias preciosos, intensos...
Alicia nunca sonhou que pudesse ser assim, tão intenso e sereno ao mesmo
tempo. Em dez anos, era a primeira vez que se sentia verdadeiramente em paz. Os
pesadelos tinham desaparecido. Na realidade nunca desconfiara que podia dormir
como fazia agora. Sempre acordava depois dele, que normalmente trazia seu café
na cama.
Ela adorava ser mimada e amada por ele.
Melquisedec Bourregard! Como adorava o
nome dele!
Soava pomposo e arrogante como o dono, que escondia do mundo uma ternura
e docilidade que somente ela conhecia.
Sentiu o corpo esquentar com as
lembranças dos momentos de paixão compartilhados. Ele tinha se transformado em
seu professor na arte dor amor e ela se descobrira uma aluna ousada e curiosa.
Alicia sentiu o rosto queimar ao pensar na mulher sensual e sedutora que os
carinhos daquele homem revelaram existir em seu interior. Adora ser seduzida por
ele, porém, sentia um prazer ímpar em vê-lo perder o controle sob suas
carícias. A sensação do poder feminino era viciante. Pensou suspirando
novamente.
E não parava por aí, ele era uma
excelente companhia. Bem humorado, inteligente, culto e com um corpo de tirar o
fôlego...
Haviam dedicado tempo a conhecer um ao outro. Contou a ele sua luta para
superar o cativeiro. Como nasceu sua paixão por vinhos e sua fabricação. Como
se sentira estranha e incomodada com a família. Dos desafios da universidade à
compra da vinícola em Vitória da Esperança. E como nascera sua amizade com
Marina.
Ele por sua vez, havia revelado tudo
sobre seu nascimento, infância, adolescência, a fase adulta e como fora parar
no esquadrão de elite que era liderado por Álvaro Nascimento. Esclareceu a ela,
que Alberto era o líder da equipe 01, a qual ele pertencia, porém Álvaro era o
chefe de todas as três equipes.
A uma Alicia boquiaberta ele revelara sua
nacionalidade. Ele era francês! Filho de um oficial francês e uma diplomata
americana. Os pais ainda vivos, casados e aposentados, viviam num chateau em
Avignon, sul da França. E não só conheciam os detalhes sobre as atividades
profissionais do filho, como em algumas ocasiões, usavam sua influência para
tirá-los de algumas situações de risco. Quando totalmente estupefata ela
perguntara como ele podia não ter sotaque, ele exibira o familiar sorriso
arrogante e dissera simplesmente que fazia parte de seu treinamento.
Em uma noite, após o jantar, falavam sobre
o passado. Melquisedec contou a surpreendente história da Irmã Maria da
Anunciação. A freira doce, de coração ingênuo e espírito de leoa, que cativara
a equipe em sua estada no santuário. Alicia se sentiu mesquinha e egoísta, por
nunca ter dado a Marina, a oportunidade de falarem sobre seus passados.
Ela sabia que o mundo real os chamaria a
qualquer momento. Mesmo com os acertos com o administrador, não poderia ficar
longe da vinícola por muito mais tempo e ainda tinha a profissão dele... Sentiu
o peito se apertar, em imaginar que teria de vê-lo partir para uma missão, da
qual ele poderia não voltar com vida.
Não sabia se conseguiria lidar com isso.
Não conseguia imaginar como Marina podia parecer tão serena durante as ausências
de Aberto Nascimento. Ela seria consumida pelo medo dia após dia.
Não permitindo que tais pensamentos, que ameaçavam violar a beleza do que
estavam vivendo, se instalassem em sua mente, levantou da cama e foi para o
banheiro.
Bourregard gemeu desapontado ao notar que
Alicia já havia acordado. Queria fazer uma surpresa... O café da manhã na cama
não seria surpresa, mas o ingrediente especial sim! Esperou um mês, o mais longo de sua vida, mas
ela precisava de tempo, precisava se sentir segura.
Depositou a bandeja sobre a cama e seguiu
para a janela, pois se entrasse naquele banheiro... Contemplando a beleza do
mar, sob a luz das primeiras horas da manhã, refletiu sobre a mudança de Alicia
nesse ultimo mês. Ele testemunhara seu desabrochar. Os olhos tinham agora, o
constante brilho que o deixava fascinado. A não ser nos momentos de reflexão,
que ela se permitia sempre que acreditava que ele não a estava observando.
Lá estava a sombra que ameaçava sua paz e felicidade. Seu trabalho.
Ele convivia com a violência da qual ela
tanto fugia. Bourregard respirou fundo.
Já tinha tomado sua decisão. Alicia era sua prioridade e sua felicidade
era o que mais importava.
O som da porta do banheiro sendo aberta, roubou sua atenção. Com o
coração na mão, a viu se aproximar. Vestia um hobby negro, tinha os cabelos
molhados do banho, o rosto limpo de qualquer maquiagem. Ela estava linda. Seu
corpo se acendeu como sempre o fazia quando ela estava por perto.
Cortou a pouca distância entre eles e a
beijou.
Um beijo apaixonado, sedutor.
- Bom dia dorminhoca. Sussurrou, ao mesmo
tempo, em que percorria a delicada pele de seu pescoço, com seus lábios.
Deus! Como adorava ouvir a maneira como ela suspirava quando fazia isso.
- Bom dia. Ela sussurrou com voz rouca.
- Seu café está servido princesa. Anunciou.
Adorou a expressão confusa em seu rosto. Amava como ela perdia a noção de
tempo e espaço quando estava em seus braços.
O riso convencido dele fez Alicia prometer
a si mesma, que depois do café, o faria provar do próprio veneno. Mas naquele
momento a fome era maior. Sentaram-se na cama e começaram a planejar o que
fariam naquele dia. Bourregard propunha que eles voltassem a mergulhar, já que
na semana anterior ele a ensinara, e havia sido uma das experiências mais belas
de sua vida.
Alicia falava despreocupadamente enquanto
Bo lhe servia o café. Notou um brilho diferente em seu olhar e se perguntava
qual surpresa ele havia preparado para aquele dia. Ao erguer a xícara, seu
coração quase parou, ao enxergar o conteúdo que estava escondido sob a mesma.
Por um instante esqueceu-se até de respirar!
Boquiaberta pousou a xícara diretamente sobre a bandeja, sem tirar os
olhos do pires e da linda e trabalhada aliança de ouro pousada sobre ele.
Oh Meu Deus! Ela pensou emocionada.
Muito lentamente ergueu o rosto para ele que a olhava com uma intensidade
nova. Alicia entendeu por fim o que queria dizer a expressão coração em seus
olhos.
- Respira. Bourregard pediu voz rouca.
Foi
então que ela se deu conta que prendia a respiração.
Respirou fundo, meio que abobalhada.
- Agora diga que aceita ser minha mulher.
Carregar meu sobrenome, dar a luz aos meus filhos.
Bourregard não sabia como interpretar a reação de Alicia. Ela estava
visivelmente emocionada, mas nenhum som saía de sua boca. Ele não queria esperar mais! Caetano levara
quase dois anos para pedir Nina em casamento.
Ele não precisava de dois anos.
Há dez sabia que a mulher surpreendida a sua frente era a mulher da sua
vida.
- Alicia, sei que as coisas nem sempre
serão como queremos, que não sou um homem fácil de lidar, mas... Eu amo você
tanto e a tanto tempo! E sei que sou amado por você! Me de a honra de ser a
senhora Alicia Bourregard. - Pediu ao fazer um carinho na face delicada.
Tocou os cabelos castanhos que o fascinavam.
O olhar dela trazia tantas perguntas, e ele tratou de responder a
principal.
- Sei o quanto meu trabalho a perturba. Sei o quanto tudo o que envolve
meu trabalho a faz sofrer. Não precisa se preocupar com isso, não mais. Tenho
mais um mês de licença, depois disso apresentarei meu pedido de dispensa ao
Álvaro - Disse olhando diretamente nos olhos dela.
A viu ofegar com uma expressão chocada no rosto.
- Vai pedir demissão? - Seria essa a
expressão correta? Perguntou-se incrédula.
Todas as vezes que falavam sobre o trabalho na Abaré, ele o fazia com um
entusiasmo apaixonado. Ele acreditava no que fazia e tinha orgulho disso. Não
passava por sua cabeça a possibilidade dele abandonar tudo por ela.
- Entre meu trabalho e você, a escolha é
óbvia Alicia. Escolho passar minha vida ao seu lado. Você escolhe passar a sua
ao meu lado também? - Perguntou.
Alicia não teve chance de responder.
O som de um dos celulares dele ecoou no quarto. O toque pegou a ambos
desprevenidos.
A maneira como ele olhou para o aparelho, fez o sangue dela gelar. Era
óbvio que aquele aparelho não deveria tocar, exceto para chamá-lo ao trabalho.
Bourregard praguejou ao ouvir o som do
toque do celular.
Entre todos os momentos inconvenientes, Álvaro escolhera o pior para
entrar em contato. Pegou o aparelho pronto para mandar o homem ao inferno, mas
não teve chance. O outro homem não esperou para ouvir sua voz para notificá-lo
dos últimos acontecimentos.
- Marina sofreu um atentado e Javier foi
gravemente ferido.
Álvaro comunicou lacônico do outro lado da linha.
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