Carlos Tavares Junior...
Dom Leon:>Você ainda está por aí ou desistiu até mesmo da minha amizade?
O que acontece com essa mulher? Não é possível que até virtualmente, ela fuja desse jeito!
Dom Leon:> Olá???
Caramba, por que ela não responde? Bom, se ela desistiu da amizade, saberei logo. Mas, confesso, estou ansioso! Nem falamos muito e ela mal respondeu duas ou três mensagens.
Vou a cozinha pegar um copo de água, segurando o celular na mão. Verifico a hora e vejo que já são 23:30h e nada de ela responder. Então, decido deixar uma mensagem. Que coisa mais engraçada esta, estou sentindo-me como um adolescente com borboletas no estômago, implorando por uma palavra escrita.
Dom Leon:> Boa noite, pequena! Bons sonhos!
− Prepare-se, Patrícia Alencar Rochetty, porque, desta vez, não vou desistir fácil. Já olhei seu perfil e tenho mil dúvidas – falo, em voz alta, comigo mesmo e me ponho a divagar.
Quem são as duas crianças que estão na foto com ela? Tento encontrar alguma semelhança e nada, a não ser a pinta igual a dela, no rosto da menininha, mas, isso não conta, pois é, visivelmente, uma pinta desenhada. Não é, nem de longe, como a dela, que estampa, como em luzes de neon, o convite: foda-me.
Ela parece tão feliz com as crianças, sem qualquer preocupação com os problemas do mundo. Em todas as fotos, seu sorriso é encantador.
Que bom que meu velho e companheiro amigo emprestou-me seu perfil, mas, a cara do Nandão, quando o chamei, na minha sala, hoje, ao final do dia, foi de puro susto. Mergulho na lembrança do episódio.
− E aí, Carlão?
− Ei, cara! Não sabia que tinha voltado de viagem! Por que não me ligou, boneca? Eu teria ido buscá-lo no aeroporto – diz, sincero, sempre disponível.
− Já provei a você quem é a boneca, na nossa amizade... – tento descontrair um pouco, antes de entrar no assunto que está incomodando-me.
− O que há de tão urgente para falar comigo? Será que, na volta ao mundo, encontrou algum clube dos bons e quer contar-me a respeito? – sempre um putão, penso comigo.
− Nandão, a viagem não correu como esperava.
− Como assim? Problemas com os distribuidores? Estive, há alguns meses, em todos os distribuidores e estava tudo normal − conclui.
− Não está nada normal – digo, sério – Fiz degustação em todos distribuidores e constatei alteração no paladar de nossas cervejas.
− Isso não é possível! Será que o armazenamento do produto está com problemas – pergunta, preocupado.
− O armazenamento, aparentemente, está em ordem. Talvez seja algum problema de logística − jogo a bomba, pois não sou de rodeios.
– É impossível! Checo tudo, antes de embarcar! Você sabe como sou comprometido com isso! – diz, chateado.
Isso é o que sempre imaginei, mas, não quero apontar culpados antes de verificar tudo.
− Nandão, não estou dizendo que você tem culpa nem mesmo que exista algum culpado – digo, calmo − o que estou dizendo é que existe um problema e não vou sossegar enquanto não resolver. Já providenciei uma reunião com todos os mestres cervejeiros responsáveis e todos os diretores. Vamos ter que encontrar uma solução, porque o consumidor do mercado internacional tem que receber o produto com a qualidade do nacional.
– Isso é o que entendo por se ter um problema... – ele passa as mãos pelo cabelo, como sempre faz quando algo o incomoda.
– Tenho outro assunto delicado para discutir com você. Na verdade, não gostaria de ter que falar dele, mas, como amigo, tenho que alertá-lo e, como presidente da empresa, não posso deixar passar. O Cláudio apresentou-me um dossiê, hoje, a seu respeito – vou direto ao ponto – Ele descobriu seu estilo de vida nada convencional, mas, essa não é a questão – faço uma pausa –, o que ele alegou é que você anda navegando pela internet, em horário comercial... – não termino de falar.
– O que é isto? – ele levanta, alterado. Raramente o vejo nervoso, visto que é um cara que vive de bem com a vida – Alguma espécie de CPI? Qual é, cara, sou responsável o suficiente para saber o que faço, não sou nenhum moleque inconsequente.
Contorno toda a situação, explicando a ele que, em nenhum momento, acreditei que estivesse deixando os negócios de lado por causa do lazer e peço discrição a respeito do assunto abordado. Ele entende e acaba me explicando tudo. Quando sinto o clima mais ameno, faço meu pedido inusitado.
− Agora, conta como surgiu essa história de Dom Leon. Fiquei surpreso quando vi o Dom Gatinho revelando-se Dom Leon numa rede social... Miau!!! – brinco rugindo com a situação e ele ri, junto comigo.
− Foi uma amiga do clube que insistiu, pedindo-me para participar. Ela vem participando de grupos de BSDM na internet e tem ficado assustada pela maneira que alguns supostos experts vêm aproximando-se das meninas iniciantes. Então, ela pediu para eu tentar orientar as meninas a respeito da verdadeira essência de nossa filosofia. E é o que tenho feito. Claro que nada muito a fundo, até porque respeito os nobres colegas que ali estão. Tem muita gente de respeito, fazendo o mesmo papel que eu.
− Sei que ficou puto com a invasão de privacidade, porém, já lhe expliquei que, por motivos profissionais e para não ser injusto com você, acabei navegando pelo seu perfil, pois precisava certificar-me a respeito da veracidade do dossiê apresentado. Confesso que não foi honroso da minha parte e, mais uma vez, peço desculpas, mas, preciso de um grande favor – olho para ele, incerto do que vou pedir – O quanto esse perfil é importante para você?
– Não sei aonde você quer chegar com essa pergunta e não vou ser repetitivo e dizer, novamente, os motivos. Meu papel, ali, é única e exclusivamente o de orientar que, a despeito dos jogos eróticos serem válidos e necessários, um jogo de dominação e submissão não é um torneio de spanking – ele levanta a sobrancelha, taxativo – E mesmo aquela menina que peça um tapa não está, necessariamente, pedindo para ser espancada! Tento frisar que deve-se ter em mente que cabe ao parceiro lembrar-se de que aquilo é só um jogo sexual e que, além da cama, existem duas pessoas, seres humanos que vivem uma vida normal e convivem, também, num contexto não sexual. Domínio e submissão é um jogo muito mais psicológico do que físico. Nós sabemos que, no BDSM, cabe ao Dominador muito mais cuidar e disciplinar do que simplesmente provocar dor. E, para finalizar, se isso responde a sua pergunta, não, esse perfil não é importante para a minha vida, visto que dou orientação apenas para aqueles que e se me procuram.
− Então, esse perfil não significa nada para você? − insisto.
− Você está deixando-me curioso, cara! Qual é a relevância desse perfil ser importante ou não para mim?
− Preciso ficar com ele – digo, sempre direto e reto.
− Como assim, ficar com ele? – pergunta, sem entender.
Ele é meu amigo, desde sempre, inclusive me ajudou a procurar minha quimera quando fugiu de mim.
− Você lembra-se daquela menina que conheci, no rodeio de Cabreúva, há dois anos atrás, e que sumiu, depois da noite que passamos juntos?
Ele fica pensando, atento ao que estou dizendo.
− Vagamente... lembrome de alguma coisa... Aliás, acho que me lembro nitidamente, agora, pois nunca havia visto você tão determinado a encontrar alguém antes.
− Pois bem, acabo de reencontrála – falo, empolgado
− E?
− E... ela curtiu uma postagem sua, Dom Miau.
− Mas, o que faz você pensar que é ela? Todas as meninas submissas e rainhas dos grupos usam pseudônimos.
− É eu percebi isso, sim, mas, ela, ou por ingenuidade ou por ser muito desafiadora, não usa. O que vi foi seu perfil pessoal.
− Isso é muito perigoso! Será que ela não tem noção do quanto pode ser negativo postar sua imagem, em grupos como esses, sem saber quem está por traz de cada perfil? – fala, preocupado – Olha, passo esse perfil porque te conheço há anos e sei do seu senso de responsabilidade, assim como sei, também, que nunca se aproveitou do conhecimento que recebeu dos grandes membros do BDSM, com a finalidade de dominar qualquer situação ou pessoa apenas para seu próprio deleite. Admiro você por se afastar do BDSM justamente por sua seriedade, já que não pode dedicar-se como deve ser, optou por não -lo. Só posso desejar-lhe boa sorte com a sua quimera, bonequinha...
Assim como eu, ele tem a mesma preocupação e não vê qualquer problema em passar o perfil para mim. E, claro, tão logo ele despede-se já acesso o perfil, escrevo uma saudação e fico logado, para poder ver caso ela fique online.
Voltando ao presente, continuo logado, não sabendo se minha estratégia vai dar certo nem se meu tiro não vai sair pela culatra, porque, como ela não se manifesta, fico aqui, como um bobão, olhando para a tela do celular, sem saber o que fazer, dependendo de uma iniciativa dela para ver o que acontece.
− Este não sou eu! Onde já se viu, com tantos problemas profissionais, eu ainda ceder o poder a alguém para tomar a iniciativa de uma aproximação! − esbravejo comigo, decidido a focar na pauta da minha reunião do dia seguinte no computador.
Como de costume, acordo praticamente em cima do computador, que está caído do lado direito da cama, com a tela aberta. Mais uma noite em que pego no sono trabalhando... aperto qualquer tecla, apenas para ele ligar e eu certificar-me da hora, quando vejo, no canto superior esquerdo, que há mensagens no facebook e, entre elas, uma que esperei a noite toda para receber.
Patrícia Alencar Rochetty:> Bom dia, meu futuro amigo! Desculpe-me pelo sumiço, ontem, mas, sem que eu pudesse evitar, acabei adormecendo nos braços de Momô.
− Só se for bom dia para você, madame! − meu modo possessivo toma conta de mim. Que porra é essa! Será que essa menina não tem noção de nada? Como é que tem a cara de pau de desejar bom dia a um amigo virtual, contando que dormiu nos braços de um infeliz! E ainda mais com um apelido brega... Momô!
Dom Leon:> Bom dia para você, também. Espero que esse tal de “Momô” tenha feito você dormir bem.
Sem aguardar resposta, fecho a tela do notebook, desiludido. Sigo meu dia, sem querer pensar na minha insensatez ao desejar desenterrar um passado que, quase que, com certeza, não vai me levar a nada. Mulheres como ela têm aos montes e, de mais a mais, penso, de forma até deveras patética, a única coisa que me enfeitiçou mesmo foi apenas aquela pinta “a la foda-me”...
Patrícia Alencar Rochetty...
Literalmente falando, desmaiei, ontem à noite! Se tivesse a menor ideia de que a massagem seria tudo aquilo, teria desmarcado a saída com o pessoal do escritório hoje, e aproveitado a sexta! Enquanto tomo meu shake, olho minha agenda do dia, no meu bloco de notas do celular.
Também acabo lembrando-me da conversa que tive, ontem à noite, antes de adormecer, com o tal Dom. Então, bem rapidinho, para não me atrasar, acesso também o face e vejo que tenho mensagens dele. Sentindo-me culpada por não ter me despedido, deixo-lhe uma mensagem de bom dia e escrevo que acabei adormecendo nos braços de Momô, nome carinhoso pelo qual chamo Morfeu, Deus alado dos sonhos noturnos. Muito cá entre nós, apesar de, para alguns, esse Deus ser apenas uma metáfora relacionada ao fato de se ter um bom e tranquilo sono, eu sinto-me íntima dele, porque, justamente por não ter problema algum em adormecer, logo que me deito, já me sinto abraçada por esse ser mitológico, numa entrega que, invariavelmente, perdura por toda a noite. Também, não é para menos, pois Momô é nada menos do que o filho de Hipnos (Deus do Sono) e de Nix (Deusa da Noite), portanto, compreensivelmente, ter sido o meu eleito para me ter em seus braços quando adormeço, não é?
Toda última sexta-feira do mês, fazemos uma reunião geral com todos os funcionários e quando falo todos, são todos, da copeira até o gerente e isso tem feito a produtividade e rendimento dos funcionários um reflexo na satisfação de nossos clientes, um ponto determinante, não deixamos nada pendente e todos os problemas corriqueiros do mês nós discutimos de forma amigável.
Aqui não tem rádio peão, se existe um problema, colocamos na mesa e discutimos civilizadamente, decidimos optar por essa lavagem de roupa suja, depois de alguns problemas internos, entre alguns funcionários empurrando um problema ao outro, através de picuinhas.
Participei de muitos cursos, conferências e treinamentos de RH e aprendendo um pouquinho aqui e outro pouquinho ali, decidi fazer diferente, todos tomaram um choque, mas ao meu modo de ver, não queria ninguém depois de uma reunião junto a diretoria, inibido ou chateado, por ter sido citado numa lavagem de roupa suja.
Então nossa reunião chama-se roupa limpa, que consiste em premiações, os funcionários que se destacaram no mês, ganham um vale compra e dependendo da sua atuação varia os valores, mas daí entra o grande lance da brincadeira, os funcionários que por outro lado atrapalharam o desenvolvimento do bom andamento no escritório, ficam encarregados de durante o mês ajudar a copeira do escritório a trocar todas as garrafas de chá e de café.
A Dona Laurinha, nossa copeira há anos, diz que não é justo, pois nunca acontece de ter ajudantes. O pessoal anda super antenado em suas obrigações, conclusão, um local de trabalho harmonioso.
Assim que a reunião termina, a Babby, segue até minha sala que fica no meio do corredor, mesmo depois que virei sócia, não quis mudar de sala, a minha sempre foi confortável e espaçosa e só de pensar de ocupar a sala do antigo sócio e imaginar ele me observando lá do inferno, me dava calafrios. Sua sala foi convertida ao arquivo morto, dizem as más línguas que quando entram lá se benzem várias vezes, antes de entrar.
Enquanto falamos do almoço de domingo na casa dela, para comemorar o dia das crianças, ouvimos uma voz, que passava ao corredor.
— Olá.
Nós duas olhamos para a porta e a Babby sorri, com simpatia e curiosidade. Eu, por outro lado, fico vermelha como um pimentão. Henrico, o grande amigo da Babby, um dos nossos maiores clientes, parado, do lado de fora, encarando-nos com um sorriso.
— Henrico! Quanto tempo meu amigo – ela levanta-se para cumprimentá-lo.
− Desculpem-me pela intromissão. Estava indo à sala do Rogério e não pude deixar de parar e dizer um olá para minhas contadoras prediletas – Aah, tá! Uma ova que foi só para dizer olá, penso comigo, fazendo cara de paisagem. Não é porque ele é lindo de morrer, de “boca fechada”, tem os olhos maravilhosos e um sorriso Colgate que, por sinal, faz-me lembrar dos cavalos dele sorrindo, que eu vou ficar tão entorpecida a ponto de engolir essa!
− Como vai Rei dos Cavalos? – estendo minha mão que, automaticamente, vira o ponto do meu corpo usado por ele para me puxar e dar-me um beijo no rosto, ou melhor, quase que no canto da boca, na verdade! Atrevido!
— Apenas um mero administrador de vários haras... Olá pequena — ele diz, já com a mão na minha cintura... Ai, meu pai! Ou ele está elétrico, ou meu corpo está dinamitado, se é que essa palavra existe! O que sei é que essa descarga elétrica causada por sua mão quente, em meu corpo, detona um monte de choquinhos e explosões em mim. Vixe, só pode ser esse tal Tantra da vida que me sensibilizou assim!
A desaforada da Babby, vendo a intimidade, do garanhão, decide entrar em ação.
− Você chegou numa ótima hora – olho para ela com um olhar "ultravioleta", de tão penetrante que é. Ai, se ela falar alguma coisa, vou quebrar o narizinho lindo dela − Estávamos, agora mesmo, combinando um almoço, no domingo, em casa, né, Patty? – ela fala, encarando-me, retribuindo meu olhar, com cara de malandra − o que acha de vir juntar-se a nós?
Reviro os olhos e escapo, depressa, das mãos dele. Ela me paga. Ah, se paga.
− Amiga, ainda não confirmei – faço cara de inocente – eu disse a você que tinha um compromisso.
− Ah, Patty, mas, seu compromisso é só pela manhã! Além disso, as missas costumam durar apenas uma hora. E não acredito que o padre fará um sermão muito demorado, não é?
Puta de uma filha, penso comigo, xingo ela, porque não sou eu que vou xingar a mãe dela, que tanto amo.
− Vamos ver, amiga, porque me comprometi com os fiéis da igreja a ajudar na catequese – segura essa, amiga, eu também sei brincar disso.
Ele fica olhando para nós duas e parece que entende meu recado, mas, claro, como um atleta hípico, não cai da montaria.
− Poxa pequenas, adoraria almoçar com vocês, mas, nesse dia, sou um dos colaboradores de um leilão de cavalos da raça Quarto de Milha, e espero que entendam que não posso faltar – levanto a sobrancelha e entorto a boca, para a minha melhor amiga, como se lhe dizendo: Tomou?
− Que pena, vamos marcar para outro dia, então – ela diz sorrindo ao ver minha expressão.
Quando tenho a impressão de que ela vai aprontar mais alguma, já respiro fundo e sigo para trás da minha mesa, com passos pesados, para ver se ela contém-se. Conversamos algumas banalidades, nada formal, mas, a Babby aproveita para lhe dar algumas dicas a respeito de um empregado de um dos seus haras e, quando penso que escapei, ele solta uma pergunta.
− E você, Patrícia, casou ou está comprometida? – o que isso te interessa? Penso, comigo, e, sem conseguir segurar minha boca, que parece ter vontade própria, solto.
− Sim! – digo.
− Não! – diz a Babby junto comigo.
Ele olha para as duas.
− Comprometida, sempre, com o Senhor meu Deus – nem eu esperava essa resposta, o que acabei de falar? Mal termino de responder e eu e a Babby, sem olhar uma para outra, estamos chorando de rir. O Henrico, fica totalmente desconcertado, não aguentando também, se juntando a nós, rindo muito desta palhaça.
— Se seu compromisso é só com Deus - putz, nem eu esperava por essa! Caraca! Olha o absurdo que acabei de falar! Mal termino de responder e eu e a Babby, sem olhar uma para a outra, estamos chorando de rir. O Henrico fica totalmente desconsertado e, não aguentando, também se junta a nós, rindo muito desta palhaçada.
- Se seu compromisso é só com Deus, acho que o cara lá de cima não vai se importar-se de você jantar comigo hoje, não é? – mas, nem que a vaca tussa! Se, em apenas 10 minutos de conversa, já sei que ele vai ao leilão do cavalo que tem farol de milha, imagina o que não saberei de cavalos ouvindo-o falando por horas! Gente, aposto que é capaz de me dizer que comprou até o Cavalo de Tróia e está disposto a invadir meu coração!
— Não, obrigada. Não posso. Tenho um compromisso inadiável, hoje, com o pessoal do escritório. A gente marca algo um outro dia – dessa vez, respondo mais rápido do que a minha amiga da onça.
— E depois do compromisso? – insistente... que saco! Vejo a lambisgoia da Babby, piscando para ele.
— Ah, vamos lá! Pense bem, você precisa comer – se preciso comer o problema é meu, onde foi no meu! Qual foi a parte do meu não que ele não entendeu? − Eu quero companhia, não gosto de comer só — faz cara de cachorro abandonado − vamos, jante comigo, hoje, eu pego você no local do seu compromisso.
Existe alguma coisa mais broxante que um cara chato? Definitivamente, não. A salvadora da pátria toma a frente, percebendo que vou mandar o cara catar conchinha na praia.
− Não querendo intrometer-me, mas, esse compromisso com o pessoal do escritório costuma durar a noite inteira. Vocês podem sair outro dia.
− Verdade! Nunca sei que horas costumo sair desses compromissos, eles são sempre tão demorados – ironizo.
Como diz o livro, sem clima para o amor, ele despede-se e, desta vez, nem chego perto dele, ficando sentada e comportadinha, atrás da minha mesa, pois, desta vez, apenas a mãozinha, queridinho... nem vem com choquinhos.
− Posso tentar entender qual o motivo pelo qual não aceitou nem ao menos jantar com um amigo? – a bruaca pergunta-me.
— Tenho happy hour com o pessoal, já disse — limito-me a responder só isso.
— Ah, sim! É claro! Convenceu-me, pois, como o nome já diz, happy hour, meu bem! E, pelo que sei, geralmente, a noite é uma criança para a senhora.
— Não mais. Como você é uma mulher casada, há anos – enfatizo – e não tem saído com essa turma do escritório, não sabe que esses encontros não têm fim – só eles, penso comigo − sou a responsável pela contração da Van que nos leva para casa. Aliás, coisa que, por sinal, na sua época de solteira, não era necessário, porque não existia essa lei seca – essa desculpa foi esfarrapada, até eu tenho que reconhecer...
− Acorda para vida, Alice! Você não está no País das Maravilhas! Acha que essa desculpa engana quem? Eu ou você?
— E você virou o que, agora, a bruxa do 71? Ou você acha que não percebi, que queria, de qualquer jeito, Jogar-me para cima dele? – respondo-lhe com outra pergunta.
— Bruxa não... Mas sou sua amiga, há anos, e, por isso, sei o quanto foge de encontros repetidos. Você formou uma muralha, em volta desse coração, e não permite que ninguém se aproxime dele. Eu percebi, quando ele te tocou, o que aconteceu – faz cara de safada – e, diga-se de passagem, você ficou bem corada... sei observar a natureza humana, amiga... E, como boa observadora que sou, sei que ele causou algumas faíscas aí dentro.
— Só se for faíscas de nojo. O cara é um porre!
− Todos sempre têm um problema – ela levanta-se, sabendo que não adianta tentar argumentar, pois nós já conversamos muito sobre isto – agora, vou pegar meus pequenos e apertá-los muito, espero por você, domingo, em casa – despede-se − Ah já ia esquecendo-me... – ela volta-se para mim e diz – pegue um pouco de água benta, na missa, e leve para nós, no domingo.
Amasso um papel e arremesso-o, na direção dela, que fecha a porta na minha cara.
− Desaforada, rio sozinha.
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