Senhoras do Santuário,
Apaixonadas saudações!
Começo o capítulo com uma super notícia: No dia 31/12/2015, chega ao Amazon, Meu Destino é Você, a história de amor da violoncelista Eva Martins e do paisagista, Theo Santini.
Vamos indicar Meu Destino aos amigos e amigas?
Ainda não leu? Os primeiros 16 capítulos estão aqui no Wattpad para degustação, deliciem-se!
Aviso, que por conta do Lançamento de Meu Destino é Você, o próximo capítulo de Prefácio de Um Amor deve atrasar um pouquinho. Peço sua carinhosa paciência, para com essa aprendiz de escritora.
Agradeço as estrelinhas e os comentários generosos e repletos de carinho!
Com vocês, o Capítulo 5 de Prefácio de Um Amor!
Apreciem sem moderação!
Beijos
Nina Reis
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“A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas às outras”.
(Aristóteles)
A iluminação retrô empregava um charme especial à decoração vintage chique da badalada casa noturna. Lindas mulheres, que pareciam saídas de um editorial de moda, trajando peças de grife, maquiagem perfeita e equilibrando-se sobre sapatos com saltos extremamente finos, circulavam entre o público que lotava o lugar.
O ambiente cheirava a perfumes caros, whisky e cervejas importadas.
A fraca e colorida iluminação não ocultava ou mesmo disfarçava a presença de jovens menores de idade, o consumo de drogas e até mesmo a prostituição de luxo.
Enquanto tentavam atravessar o mar de pessoas que lotavam o andar térreo da boate, em direção às escadas que as levariam ao mezanino, local da mesa reservada com antecedência por Lívia, que seguia à frente, Isadora não conseguia extinguir a sensação de que havia algo muito errado com aquele lugar.
“Não que o cenário fosse muito diferente nas outras casas noturnas da cidade” – ela pensava quando, enfim, alcançaram a escadaria. Sabia que drogas e prostituição estavam presentes de diversas formas e em todas as classes sociais.
Na alta sociedade, prostitutas eram chamadas de acompanhantes de luxo. Cafetões atendiam pelo status de empresários ou agenciadores. E as drogas eram consumidas com a mesma permissividade e liberalidade do álcool.
As roupas de grife, cosméticos importados, relógios de ouro, canetas cujos valores eram indecentes e bolsas de designers exclusivos somente vestiam de civilidade e sofisticação a realidade degradante e sórdida desses universos.
“Não era uma mulher com falsos pudores ou moralismo. Cada pessoa era livre para fazer o que desejasse com seu corpo e, consequentemente, sua saúde. Mas era a realidade escondida por trás desse cenário, que a enojava e indignava” – ponderou consigo mesma, ao mesmo tempo em que pedia licença e tentava avançar na concorrida escadaria, também lotada.
Esbarrou em uma moça linda, de longos cabelos negros, pele de cetim e lindos olhos azuis e a ouviu negociando o valor e número de horas que ficaria à disposição do “cliente”.
Essas mulheres, muitas vezes, viviam em uma nova forma de escravidão, subjugadas por criminosos que as exploravam e violavam. E não importava o fato de a cocaína, ecstasy ou heroína serem experimentados e utilizados em ambientes luxuosos e requintados. O caminho que as drogas, sejam elas quais fossem, percorriam para chegar a esses lugares era marcado por violência, morte e o sangue de vítimas inocentes.
“Ela não era uma puritana” – disse para si mesma.
“Até já experimentara fumar um baseado de maconha anos atrás, tomara um porre histórico, com as mesmas amigas que a acompanhavam aquela noite, e fizera sexo casual no primeiro encontro” – recordou. As lembranças provocaram uma careta de desagrado.
Ao chegarem, enfim, ao mezanino, Dora tinha um esboço de um sorriso ao recordar em como as duas primeiras experiências deixaram-na doente. Quanto ao sexo casual, fora satisfatório, porém não o bastante para animá-la a repetir a experiência.
– Ficaremos por uma hora – Ângela falou em tom de voz um pouco mais alto, assim que ocuparam a mesa que tinha uma vista privilegiada do lugar. O som da banda de rock sinfônico dominava o ambiente.
– Para mim, está ótimo – Dora concordou aliviada ao ocupar seu lugar à mesa.
Não conseguia explicar a sensação ruim que a acompanhava desde que deixara o Café do Municipal.
– Vocês são duas velhas! – Lívia ralhou divertida. – Sabe como é difícil conseguir convites Vips para um lugar badalado como esse? – perguntou.
– Como foi mesmo que conseguiu esses convites e a reserva da melhor mesa deste lugar? – Dora perguntou.
– Estou ficando com um dos seguranças! – Lívia comentou em tom que imitava um sussurro.
As amigas gemeram em um escancarado sinal de desgosto pelo gosto duvidoso da loira por homens fortões e truculentos.
Um garçom se aproximou, anotou os pedidos das bebida e, discretamente, se afastou. Dora observou, impressionada, a habilidade e a agilidade com que o homem trafegava por entre a pequena multidão que lotava a boate.
– Angie, relaxa e aproveita que a legião do mal deu uma folga para você esta noite! – Renata, a mais jovem do grupo, comentou provocando risos e comentários bem-humorados pela maneira a que se referia aos homens que Ângela chamava de família Soprano.
– Isso não é engraçado – Angie reclamou.
– Ah, é sim, Angie – Sarah provocou. – Eu juro que eu queria ter visto a reação do tal do Raul, o designer gráfico, quando ficou de frente para a legião do mal – concluiu a morena de cabelos curtos e visual moderno, referindo-se ao último namorado da enfermeira.
A enfermeira revirou os olhos, contrariada.
– Isso é um pesadelo – ela retrucou –, vocês não imaginam o que é estar em um restaurante e do nada aparecem cinco homens altos, fortes, completamente diferentes um do outro e que se dizem serem seus irmãos! – exclamou realmente irritada. – E aterrorizam o cara legal que estava interessado em você! – reclamou.
Apesar do mau humor da ruiva, as amigas riram divertidas ao imaginar a cena.
– Cada uma de nós adoraria dar uma lição nessa sua família Soprano – Dora ponderou –, mas confesso que imaginar a cara do tal Raul, no momento em que ficou de frente com eles, é engraçado.
Ângela se rendeu ao bom humor das amigas.
– O pior aconteceu depois – ela revelou.
– Conta! Conta! Conta! – as amigas pediram entusiasmadas.
– O Raul me procurou para pedir desculpas por ter saído do restaurante correndo, literalmente – enfatizou –, e como se já não fosse constrangedor o suficiente, ainda me parabenizou por minha família tão unida. Disse que exemplos como os dos meus pais inspiravam casais como Angelina Jolie e Brad Pitt a adotarem crianças de continentes diferentes.
As amigas gargalharam com gosto diante da ingenuidade ou burrice do sujeito.
– Ele era um idiota covarde e, além de tudo, baixinho – Lívia comentou –, o cara tinha uns cinco centímetros a menos que você – a loira observou.
– Existem muitos casais em que o homem é mais baixo que a mulher, e são muito felizes – a enfermeira se defendeu –, tamanho não é importante!
A enfermeira se arrependeu das últimas palavras assim que fechou a boca. A reação das amigas fora exatamente a que imaginara.
– Ah, é sim! – as quatro amigas responderam em um bem-humorado uníssono. Ângela não resistiu e também entrou na brincadeira.
O garçom, que retornara com os pedidos, serviu à mesa, rindo dos gracejos bem-humorados das cinco amigas. Após deixar os cinco drinques e cinco garrafas de água, ainda rindo, seguiu para a mesa ao lado.
– Um brinde ao sucesso da Dora – Lívia disse erguendo seu copo –, e claro, aos homens grandes – completou com malícia.
As demais repetiram o animado brinde da Lívia e depositaram as bebidas sobre a mesa sem experimentá-las. Descontraídas, se concentraram em abrir as garrafas de água.
O brinde animado chamara a atenção dos homens e mulheres próximos que, curiosos, observavam o quinteto ignorar os charmosos e sedutores drinques. Sob olhares incrédulos, as mulheres, ainda falando sobre os diversos tamanhos de homens, tomavam apenas água.
Dora, assim como as demais, não deixara de perceber os olhares curiosos que atraíram com o brinde, que passaram a confusos quando elas ignoraram as bebidas. Elas tinham um acordo tácito de não tomarem nenhuma bebida que não fosse lacrada, ou que não observassem de perto o preparo. Gostavam de brindar, do aroma, cor e textura dos drinques, mas desde que Sarah e Renata foram drogadas por bebidas “batizadas”, com a droga conhecida como a droga do estupro, estavam sempre atentas.
Na época, após acordarem em camas desconhecidas, sem recordar com quem ou quantas pessoas passaram a noite, iniciou-se o drama partilhado com as demais. Durante seis longos e tortuosos meses, encontravam-se na casa de uma delas para abrirem, juntas, os exames de DST´s e HIV.
No terrível primeiro mês, somou-se aos numerosos exames, o de BhCG. Dora recordou como as amigas choraram aliviadas ao lerem os resultados negativos.
“Não acreditamos que uma coisa dessas possa acontecer conosco ou com alguém próximo a nós, até que um dia acontece” – refletiu.
Dora sorriu e se desfez das lembranças sombrias do passado. Sentindo o espírito mais leve, voltou a se concentrar na animada conversa que reinava na mesa.
Falavam sobre bobagens e riam dos comentários irônicos, provocando umas as outras quando um homem alto e muito forte se aproximou da mesa.
Com uma expressão repleta de malícia na face, Lívia apresentou o “tal segurança” com quem estava saindo e se levantou para deixar a mesa.
– Uma hora – Angie lembrou.
– Pode deixar, mamãe! – a amiga retrucou e, de mãos dadas com homem enorme e com um safado sorriso no rosto, seguiu para algum canto escuro da boate.
– Dessa vez ela caprichou, o sujeito parece um armário! – Dora comentou impressionada. O homem realmente possuía músculos exagerados.
– Um armário prestes a explodir, você quer dizer! – Ângela retrucou.
Dora riu da observação irônica, porém verdadeira, da enfermeira. Sarah e Renata, não deixaram por menos e especularam sobre quais músculos, do tal sujeito, mais atraíram a amiga maluquinha.
A conversa voltou a fluir leve e descontraída. Falavam sobre futilidades, em uma noite dedicada exclusivamente a se divertirem. Após meses mergulhadas em seus trabalhos e dedicadas, quase exclusivamente, à suas carreiras, as amigas estavam determinadas a aproveitarem a folga.
Contemplando as três mulheres na mesa com ela, e a loira doidinha que fora dar um amasso no segurança da boate, Dora agradeceu em silêncio a amizade que as unia. Eram mulheres diferentes, com escolhas de vida distintas, mas unidas pela amizade que sempre se fazia presente, mesmo nas ausências e nas distâncias.
Porém, apesar da excelente companhia, a sensação ruim que sentira ao entrar na boate, ainda a acompanhava.
Dora deixou o olhar vagar para as mesas em torno à delas e flagrou o exato momento em que um sujeito elegantemente vestido passava um saquinho transparente com duas cápsulas à jovem que não aparentava ser maior de idade. O coração ficou apertado com aquela cena.
Não conseguia entender essa necessidade de estar constantemente bêbado ou chapado para se divertir que a sociedade atual parecia compartilhar.
Os olhos vagaram para o andar térreo e, sem perceber, pegou-se mirando a entrada do estabelecimento com certa expectativa.
Olhos verdes acinzentados invadiram sua mente e ela quase suspirou ao relembrar o exato momento em que mirara àqueles olhos incomuns, naquela mesma noite. Sentiu um arrepio de expectativa percorrer seu corpo ao recordar em como o braço dele parecia perfeito em torno de sua cintura, ou como seu corpo se encaixava perfeitamente ao dele, apesar da diferença de estatura, ou mesmo de massa muscular e largura.
“Dante Tommazelli” – repetiu o nome que, em sua opinião, estranhamente não combinava com a imponência e a energia de crua masculinidade que emanava do homem com nome e sobrenome italianos, mas que curiosamente a fazia lembrar-se da perfeição das esculturas gregas.
“O agente de segurança a impressionara” – admitiu. “E muito” – reconheceu.
“A maneira como seu corpo reagira a ele, ainda a deixava atordoada. E o mais perigoso, o homem a fazia desejar perder o juízo, a respiração e o controle” – pensou secretamente divertida.
Observava, distraidamente, o andar térreo da casa noturna quando, parecendo se materializar da sua mente, enxergou o homem que dominava seus pensamentos parado junto ao bar.
Dora sentiu a respiração falhar.
O corpo reagiu desperto à presença do agente de segurança.
“Ele viera!” – pensou contemplando o homem de um metro e oitenta e cinco, ombros largos na medida certa, braços fortes para ampará-la e profundos e sábios olhos verde acinzentados.
Mesmo à distância e com a fraca iluminação, conseguia identificar que Dante a encarava com a mesma intensidade com que olhava para ele, o que parecia potencializar ainda mais a irresistível atração que experimentara desde que os braços fortes enlaçaram sua cintura e impediram sua queda.
Bailarinos exigiam o máximo de seus corpos. Conhecer os limites de sua fisiologia era o caminho natural para se tornar um bailarino profissional. Conhecer o que estimulava suas terminações nervosas e como ativá-las era um bônus adicional. Dora conhecia seu corpo com intimidade e conhecia os caminhos para estimulá-lo e intensificar o prazer. E esse era o motivo pelo qual preferia beijos e carícias preliminares ao sexo propriamente dito.
Adorava ser beijada longamente e sentir seu corpo ser explorado sem pressa, mas quando chegavam ao momento em que seu corpo era invadido por outro, sentia-se desconfortável, constrangida, insatisfeita. Por isso, aos vinte cinco anos, tivera apenas três amantes, incluindo o sujeito com quem transara em um encontro sem compromisso.
Nunca entendera o porquê essa parte do sexo era incômoda para ela. Mas era o que acontecia. Porem, por algum motivo que ainda desconhecia, desejava vivenciar essa experiência com aquele homem sobre o qual não sabia exatamente nada, exceto que se chamava Dante Tommazelli, trabalhava na Abaré e era amigo de Angie Garlipe.
Sem deixar de encarar o agente, que estava recostado contra o balcão do bar da casa noturna, Isadora se permitiu explorar, com os olhos, toda a extensão do homem que possuía uma aura sombria e perigosa. Dante emanava perigo e testosterona em uma intensidade que deveria ser proibida, dentro das normas de etiqueta e do politicamente correto.
“Cristo! Ela estava encrencada!” – pensou quase suspirando ao terminar a exploração.
“Queria ser beijada e acariciada por aquele homem!” – admitiu, sem tirar os olhos do homem que roubava seu fôlego e decididamente seu juízo.
“E o melhor, ele parecia querer ser beijado e acariciado por ela também” – pensou sorrindo para o homem que, do andar térreo, acenou e devolveu o sorriso.
Sem parar para pensar ou dar atenção à sensação ruim que se intensificara, balbuciara uma desculpa qualquer para as amigas, deixou a mesa e, com passos rápidos, seguiu em direção às escadas.
Ao descer as escadas, desviando dos corpos que pareciam se amontoar em cada canto do lugar, seus olhos estavam presos aos do homem que caminhava em sua direção.
“Cristo! O que acontecia com ela?” – Perguntou-se ao sentir o corpo quente e gostosamente dolorido.
Nunca experimentara algo parecido. Estava ao mesmo tempo curiosa e fascinada.
– Perdido, senhor agente? – ela perguntou ainda sorrindo.
Dante não retribuiu seu sorriso. Na verdade, fitava-a com uma expressão extremamente séria, perigosa.
Dora sentiu um objeto ser pressionado contra suas costas. Levou dois segundos para identificar o formato cilíndrico do cano de uma arma, e sentiu como se seu coração parasse de bater.
“Um desgraçado qualquer apontava uma arma contra suas costas em um lugar lotado de pessoas!” – pensou entre indignada e apavorada.
Um calafrio de repulsa percorreu seu corpo no exato momento que uma mão agarrara seu braço direito com disfarçada brutalidade.
– Quietinhos os dois, ou muita gente vai morrer aqui hoje – o homem grunhiu próximo ao rosto da bailarina.
Dora não ousou olhar na direção do bandido que tentava assaltá-la. Assustada com o desdobramento da tentativa de furto, não tirava os olhos do homem perigosamente sério à sua frente.
– Solta o braço dela, ou quebro o seu aqui mesmo – Kiron disse em tom de voz baixo. Sentiu que os demais membros da equipe se posicionavam próximos a eles.
“O lugar estava lotado, reagir em local tão cheio, terminaria na merda de um desastre” – o grego praguejou em silêncio.
Os olhos negros assustados da bailarina, o faziam desejar matar lentamente cada um daqueles homens.
Um silêncio sepulcral se fazia ouvir no canal de comunicação. Todos aguardavam seu sinal para decidir qual era o plano de ação a seguir.
O timbre de voz gélido e mortal do agente de segurança, não surpreendera somente a ela, mas sentira o sujeito que agarrava seu braço vacilar ante a severidade do timbre do homem que era mais alto e mais preparado. Porém, no momento seguinte, o bandido aumentou a pressão do agarre, machucando-a.
Isadora cerrou os lábios negando-se a gemer.
“Não daria esse gosto ao desgraçado” – pensou ainda amedrontada.
– Qualquer movimento em falso, e a morena morre – o homem que mantinha a mão pressionando o braço da bailarina, anunciou. E para mostrar que não estava para brincadeira, engatilhou a arma.
Dora ofegou ao ouvir o clique da arma colada ao seu corpo.
– Amigos seus? – ela perguntou em tom irritado, ainda com os olhos grudados nos olhos do agente de segurança.
Kiron entendeu que ela ainda não enxergara o homem que estava atrás dele.
– Meus amigos não cometeriam o erro de colocar uma arma nas minhas costas – esclareceu.
Os olhos negros ficaram ainda maiores ao compreender o grau do perigo no qual se encontravam.
As pessoas em torno deles, entorpecidas pelo álcool ou pelas drogas, não se davam conta do que acontecia.
O homem atrás da bailarina riu com desdém.
– É com você que meu chefe quer ter uma conversinha, morena! – o sujeito anunciou com o rosto muito próximo ao da bailarina. – Andou metendo esse seu narizinho aonde não era da sua conta, e deixou meu patrão solitário e furioso – comentou com uma voz sordidamente divertida.
Isadora sentiu o sangue congelar em suas veias ao compreender que não era vítima de um assalto em uma boate, e sim de uma emboscada.
“Como esses homem chegaram até ela?” – perguntou-se em um breve instante de pavor. Cercara-se de todas as garantias de que sua identidade seria mantida em sigilo antes de formalizar a denúncia, meses antes.
“Ela morreria àquela noite” – constatou. E uma gelada sensação invadiu seu peito, que, em seguida, ardeu com as chamas da indignação.
“Que porra acontecia ali?” – Kiron se perguntou com olhos fixos na bailarina, ao entender que a mulher sabia exatamente o porquê sua vida estava em risco.
– Não tenho medo do seu chefe – Dora resmungou e puxou braço com força, em uma tentativa de se livrar do agarre que feria sua pele. O bandido apertou ainda mais a pressão com que a prendia.
Kiron quase sorrira ao enxergar o brilho de fúria nos olhos negros. Raiva era um sentimento com que ele conseguiria lidar, medo somente pioraria a situação.
“Isso, pequena, fique com raiva, muita raiva” – pediu em silêncio.
– Vamos ver se continua com a mesma opinião quando estiver sozinha com ele – o homem resmungou e a empurrou para frente em um claro sinal para que caminhasse. – Ele pretende se divertir muito com você – avisou.
– Ele terá de me matar primeiro – Isadora rosnou e manteve-se no mesmo lugar.
O bandido a empurrou novamente, dessa vez com mais força, porém o suficiente para não chamar a atenção indesejada.
– Ele primeiro vai se divertir com você e somente depois, muito depois, irá matá-la – anunciou os planos sem qualquer vestígio de culpa ou remorso.
– Ele será um homem morto antes mesmo de tocar um único fio do cabelo dela – Kiron anunciou com uma voz isenta de qualquer emoção. O soldado assumira o controle.
O sujeito que segurava a arma contra as costas do grego, falou pela primeira vez.
– Caminhando e sorrindo em direção à saída – ordenou. – Um vacilo, e o berro canta aqui dentro mesmo – ameaçou e empurrou o homem em direção à bailarina negra.
Obstante a tensão e o perigo de uma noite de verdadeiro terror, caso os bandidos começassem a atirar indiscriminadamente dentro da boate, Isadora quase sorrira ao perceber que a estatura de Dante encobria o outro bandido, mais baixo e franzinho. Mas a graça terminara ao perceber que o outro homem parecia portar uma pistola automática de grosso calibre, pelo rápido vislumbre que tivera da arma prateada.
Caminhando ao lado do agente de segurança, Dora enlaçou sua mão direita com a mão esquerda dele e a apertou em um pedido mudo para que o homem olhasse para ela. E ele o fez.
– Perdoe-me por colocá-lo nessa confusão – disse com olhos cheios de lamento.
O grego entrelaçou os dedos nos dela e piscou charmoso.
Porra! Praguejou.
“A mulher era corajosa” – reconheceu orgulhoso por Isadora não demonstrar o quanto estava assustada e amedrontada.
A cada passo, a tensão e o perigo aumentavam ainda mais. O risco de serem abordados por alguém que reconhecesse a bailarina ou pelos amigos dos homens que mantinham as armas contra seus corpos tornava-se maior a cada instante.
Sem permitir que os dois bandidos percebessem, Kiron os examinara, avaliando as possibilidades de reagir à tentativa de sequestro de Isadora. As chances de escaparem com vida seriam drasticamente menores, caso entrassem no veiculo em que os dois marginais pretendiam transportá-los para levá-los até o homem que chamavam de patrão.
A mente de Isadora buscava freneticamente argumentos para convencer os bandidos a deixarem o agente de segurança na boate. Pensar que suas ações, mesmo que involuntariamente, colocara a vida do homem em risco, atormentava-a.
Estava assustada, mas não estava com medo. Não queria morrer! Estava com vinte e cinco anos, no auge de sua vida profissional, tinha uma família que amava e amigas que eram verdadeiras irmãs. Porém, cada célula do seu corpo se recusava a demonstrar medo ou a se curvar diante da escória que aqueles homens representavam.
“Se eu morrer essa noite, morrerei como uma Baptista” – prometeu a si mesma.
– Percy Jackson, os heróis do Olympo estão posicionados nos portais do Tártaro – o silêncio no canal de comunicação foi quebrado pelo líder da equipe 1.
“Isso era tudo o que ele precisava saber” – Kiron pensou concentrado em todos os movimentos dos homens armados. Não passou desapercebido, porém, a provocação da equipe 1 à sua origem.
“Se saíssem vivos dessa, isso teria volta” – prometeu.
– Sorriam, casal feliz – o marginal que segurava a arma contra as costas da bailarina exigiu quando se aproximaram do funcionário que recolhia as pulseiras na saída da casa noturna.
Isadora sentiu as batidas de seu coração retumbar assustadoramente altas em suas têmporas. O corpo tenso, a mente evocava os últimos momentos com os amigos e com a família. Não se arrependia da denúncia que fizera e a colocara sob a mira de assassinos. Não seria digna de seu sobrenome e do sangue que corria em suas veias se permitisse que o filho da puta continuasse a sodomizar e escravizar crianças que mal chegavam a pré-adolescência.
“O homem era um monstro” – pensou com repulsa.
“Se tivesse outra chance, faria tudo novamente” – decretou para si mesma.
Isadora estava perdida em suas conjecturas quando sentiu o agente de segurança puxar a mão que mantinha entrelaçada a sua. Uma, duas, três vezes.
O coração acelerou ainda mais ao perceber que o homem tentava avisá-la de alguma coisa.
Com um sorriso congelado no rosto, ela cumprimentou o segurança da boate e estendeu o braço, que o bandido mantinha sob seu agarre, no qual estava a pulseira de acesso da boate. Dante cumprimentou o sujeito com um discreto aceno de cabeça e estendeu a mão que mantinha presa a sua.
– A noite mal começou, e vocês já estão de saída? – o homem muito alto e de longos cabelos loiros perguntou em um tom indolente ao retirar as pulseiras dos pulsos dos dois bandidos.
Isadora sentiu a respiração ficar presa em sua garganta ao notar a quase imperceptível troca de olhares entre o segurança da boate e o homem que segurava sua mão.
O segurança sorriu para ela. Um sorriso sedutor, e a encarou como se interpretasse que ela tinha planos nada inocentes para os três homens que a acompanhavam.
Confusa, sentiu Dante puxar sua mão mais uma vez.
Era um aviso para que ficasse atenta, ela compreendeu.
Tudo aconteceu rápido demais.
Ao cruzarem a porta que dava para o estacionamento, um automóvel 4x4 parou diante deles e um terceiro bandido desceu do carro e abriu as portas de trás.
Isadora sentiu Dante puxar sua mão três vezes, em seguida, o ouviu gritar para ela se jogar no chão. Ela não questionou a ordem ou hesitou, instintivamente obedeceu e se lançou sobre o asfalto do estacionamento.
E, no momento seguinte, tudo saiu de controle.
Em um instante, Dora tinha uma arma contra suas costas, no seguinte, jogava-se ao chão ao mesmo tempo em que o agente de segurança, com reflexos perfeitos, surpreendia os bandidos com golpes precisos.
Tendo a seu favor o elemento surpresa, Kiron usou as mãos e os braços para atingir o que estava próximo a ele, e as pernas para golpear o sujeito que a mantivera a arma contra as costas da bailarina, desarmando-os.
No exato momento que as armas voaram das mãos os criminosos, foram cercados por uma legião de homens fortemente armados que apontavam um arsenal de armas em sua direção e dominavam o terceiro bandido que tentara fugir.
As armas chegaram ao chão ao mesmo tempo em que o corpo bailarina batia contra o asfalto do estacionamento. Isadora não pensou, simplesmente reagiu.
Kiron acabara de derrubar o segundo marginal, na ação que durara poucos segundos, quando notou o pesado silêncio que os cercava. Com todos os sentidos em alerta, mirou os homens da equipe 1 que estavam acompanhados dos três homens da família Baptista e mais alguns que ele identificou serem militares à paisana.
Todos olhavam, com olhos muito abertos, em direção à Isadora que apontava uma das armas, tiradas dos bandidos, em direção aos homens caídos sobre o asfalto do estacionamento.
O peito vibrou de orgulho pela reação da mulher valente e guerreira.
A pequena bailarina não correra para os braços da família, trêmula e chorosa. Não. A mulher que quase roubara sua sanidade encarava os bandidos com fúria.
– Dora, me dá essa arma! – a voz do Major ecoou poderosa.
A bailarina ignorou o pedido e se aproximou dos bandidos.
– Desgraçados! – ela rosnou com raiva. – Vocês não são humanos, são monstros! – gritou e apontou a arma em direção à virilha do sujeito que machucara seu braço. – Vocês violam crianças, seus filhos de umas putas! – disse aproximando-se ainda mais. – Vou garantir que não machuquem crianças nunca mais! – disse e engatilhou a arma.
– Abaixa essa arma, Dora! – O coronel Davi Baptista pediu.
Os homens mantinham suas armas apontadas em direção aos bandidos.
Mais uma vez, a mulher ignorou o apelo da família.
A ira, revolta e indignação queimavam dentro ela.
Apesar de ainda não conhecer os detalhes, Kiron compreendera o porquê a pequena bailarina com alma feroz fora parar sob a mira de assassinos. Ela defendia crianças inocentes.
– Não deixaremos que eles machuquem mais ninguém, confie em nós, agora nos dê essa arma, Dora – o tenente-coronel Luiz Baptista pediu.
– E o quê? – ela gritou em resposta. – Eles irão para a prisão e daqui a dezoito meses estarão livres para aterrorizar crianças? – ela perguntou.
Naquele momento, Kiron sentiu sua alma se curvar para honrar àquela mulher.
Porém, apesar de também desejar ver o mundo livre de monstros como aqueles, não poderia permitir que fosse ela a tirar a vida dos filhos de uma puta.
Ceifar uma vida, por mais contaminada pelo mal que essa possa estar, marcava a alma e o espírito de quem o fazia. Isadora tinha a alma e o espírito brilhantes e translúcidos como a luz.
Ela transmitia isso enquanto dançava. Expunha a alma, o espírito e coração, e a beleza era captada pelas pontas de suas sapatilhas.
Não poderia permitir que ela contaminasse seu espírito, coração e alma com o sangue daqueles desgraçados.
– Isadora – ele chamou e se aproximou –, me entrega essa arma – repetiu o pedido feito pela família.
Ela balançou a cabeça de um lado para o outro, negando-se a soltar a arma.
Os dois marginais acompanhavam a cena com olhos esbugalhados.
– Isadora, olha para mim – ele pediu. – Olha para mim, Isadora – repetiu.
Ela respirou fundo duas vezes antes de atender ao pedido e encarar o agente de segurança.
– Eu sei o que está sentindo – disse com uma voz tranquila –, cada um de nós sente o mesmo que você.
– Então por que não me deixam atirar e acabar de vez com estes monstros? – perguntou irritada.
– Você não é assim – ele disse encarando-a.
– Eles machucaram crianças – ela retrucou.
– Sim, e merecem pagar por isso – concordou –, mas não com você pagando um preço tão alto.
Kiron a viu hesitar pela primeira vez e um alívio sem precedentes alagou seu peito.
– Isadora, me dá essa arma e deixa... – ela o interrompeu.
– Se disser: e deixa que os homens cuidem disso. Juro que atiro em você e depois atiro neles – retrucou.
Kiron riu divertido da provocação.
– Acredito em você – ele disse mirando os olhos negros que pareciam queimar com as emoções que se digladiavam dentro dela.
Após hesitar um momento, ela também sorriu e após uma longa respiração entregou a arma para ele. Kiron recebeu a arma e a puxou para dentro dos seus braços.
– Isso, pequena. – sussurrou à mulher que se agarrara a ele.
– Tira ela daqui, agora! – Alberto Nascimento exigiu.
Não questionou ou hesitou às ordens do líder da equipe 1. Ainda não sabia quem era o homem que Isadora denunciara, mas percebera que o sujeito tinha poder e conexões.
O árabe estacionou um carro negro atrás do utilitário dos bandidos. Ele não perdeu tempo fazendo perguntas ou pedindo permissões. Simplesmente arrastou a bailarina para o interior do veículo que no segundo seguinte deixava o estacionamento a toda velocidade.
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A tensão dominava o interior do automóvel que, após estar a uma distância segura da casa noturna, reduzira a velocidade para não atrair a atenção. Dentro do espaço reduzido do veículo, a respiração ofega da bailarina ressoava baixa e imprecisa.
Deitada de bruços sobre o banco de passageiros, tendo o corpo do agente de segurança sobre o seu, Isadora tentava controlar a miríade de emoções que brigavam em seu interior.
Fúria, indignação, medo, consternação e constrangimento alternavam-se em seu peito em uma velocidade vertiginosa e uma intensidade aterradora.
Dora sentia todo o corpo dolorido. O braço machucado latejava e uma sensação de ardência no cotovelo esquerdo e na perna direita indicava que os ferira na queda.
“Mas essa não era a pior parte” – pensou.
A respiração regular do agente, que protegia o corpo dela com o seu, soprava quente e cálida sobre seu pescoço. O corpo mesmo tenso, dolorido e machucado, recebia cada sopro de ar como uma carícia aveludada e sedutora.
Era uma doce tortura que fazia o corpo, ainda que ferido, queimar por ele.
Dora respirou fundo e concentrou seus pensamentos nos acontecimentos recentes.
Ela ainda não conseguia entender como fora identificada pelo homem que delatara há dois meses, por abuso, estupro e tortura de crianças e pré-adolescentes. Ou mesmo como sua família descobrira sobre a ameaça contra sua vida, antes mesmo que ela o sequer suspeitasse.
“Cristo! Ainda não conseguia acreditar que escapara com vida daquela emboscada” – rezou agradecida.
Tomara todo o cuidado e medidas necessárias para resguardar sua identidade. Não realizara a denuncia até assinar documentos que garantiam seu anonimato.
“Como o desgraçado descobrira a seu respeito?” – perguntava-se.
Apesar de desconfiar quais seriam os possíveis desdobramentos e o impacto em sua vida pessoal, ela se negava a fazer conjecturas. Não sofreria por antecipação. Comprometeu-se a lidar com um problema de cada vez.
Ela fechou os olhos e sentiu o hálito do agente ainda mais próximo à sua pele. Dante baixara um pouco mais a cabeça e por poucos centímetros, quase beijava sua pele.
“Tudo não passara de encenação!” – lamentou.
Compreendera que estava sendo seguida e monitorada no momento em que os demais agentes, seu pai e seus irmãos, surgiram do “nada”, como se viessem de um buraco negro, para dominar os criminosos no estacionamento da boate.
“O homem apenas fizera seu trabalho” – reconheceu ao entender que o gente de segurança nunca estivera realmente atraído por ela.
Dora adicionou mortificada ao vórtice de sentimentos que experimentava.
“Praticamente se oferecera ao sujeito” – gemeu em silêncio, consternada, por perceber que seu corpo teimava em responder à proximidade do corpo sólido e quente sobre o seu.
Tentou se erguer e se afastar, para resguardar o mínimo de dignidade.
“Afinal, ela tinha amor próprio!” – ralhou consigo mesma e, apoiando as mãos sobre o banco do carro, tentou erguer o tronco e se libertar da proteção do corpo do agente.
– Precisa continuar abaixada – Kiron resmungou entre os dentes.
“Yáónoma tu Thée!” – ele clamou em silêncio.
Ao apoiar os braços no banco para tentar erguer o corpo, inadvertidamente, a pequena, presa sob o seu corpo, levantara os quadris antes de tentar erguer o tronco. E mesmo sob tanta tensão e risco, o simples roçar do traseiro arredondado sobre seu membro causara um efeito devastador.
“Estava rígido e dolorido por ela” – admitiu contrariado.
Desde o momento que cobrira o corpo de Isadora com o seu, em uma ação padrão em situações de resgate, Kiron experimentava o inferno na terra.
Apesar de manter o peso distribuído entre seus braços e pernas, e manter parte de seu corpo afastado do dela, conseguia sentir as curvas deliciosas do corpo trabalhado pelo ballet clássico e a temperatura morna e suave que emanava dela, apesar de toda adrenalina causada pela tentativa de sequestro.
O perfume de orquídeas selvagens ainda estava impregnado na pele cor de café frappé que, de perto, parecia ainda mais macia do que ele imaginara.
Apesar de todas as tentações, ele conseguira manter seu corpo sobre férreo controle, até o momento em que a bailarina roçara seu traseiro firme e saborosamente redondo sobre seu membro. Se Isadora voltasse a se mexer, ele estaria em sérios problemas.
Kiron voltou a mirar as linhas elegantes do pescoço e ombros da bailarina e sentiu algo se comprimir em seu peito ao notar as linhas de tensão.
Mesmo com todo o esforço que a pequena e feroz bailarina fazia para parecer forte, ele sentia o quanto ela estava sensibilizada pelos últimos acontecimentos.
Isadora ainda tinha a respiração ofegante, e ele conseguia sentir os batimentos acelerados de seu coração. A tensão que enrijecia os ombros eram sinais do corpo de que a alma estava prestes a se romper.
“Às vezes, a alma precisava chorar para se fortalecer” – refletiu seduzido pelo corpo morno e pequeno sob seu.
– Você está pesado! – Isadora resmungou em um sussurro.
“ A pequena era esperta” – Kiron pensou e disfarçou um sorriso divertido.
– Mentirosa – respondeu com voz tranquila. – Não estou colocando meu peso sobre você – ele murmurou em resposta.
Ele sentia um desejo quase irresistível de afagar os cabelos negros.
– Estou me sentindo sufocada – ela murmurou incômoda e voltou a se mexer.
Dessa vez, ele fora mais rápido e conseguira evitar que o quadril arredondado tocasse o seu.
– Fique quieta, pequena – pediu.
O som da voz era quase um gemido, nascido do mais genuíno sofrimento. Faltava muito pouco para ele mandar tudo ao inferno e deslizar as mãos pelo corpo moreno que parecia gritar pelo seu toque.
Kiron engoliu um gemido do mais genuíno sofrimento.
– Está tudo bem aí atrás? – o agente de traços árabes perguntou.
– Sim.
– Não.
Kiron e Isadora responderam ao mesmo tempo. O grego notara o mal disfarçado tom de divertimento na voz do árabe.
– Estamos fazendo pequenos ajustes, só isso – ele grunhiu irritado.
Isadora bufou contraída.
O silêncio voltou a reinar absoluto no interior do veículo. Minutos mais tarde, o carro parou em uma rua tranquila e arborizada.
– Primeira parada – o árabe anunciou ao soltar o cinto se segurança.
Isadora tentou se erguer, porém o agente, mais uma vez, a manteve imóvel.
– Fique abaixada! – Kiron resmungou.
– A área está segura, Percy Jackson – o geek anunciou no canal de voz. – Último Olympiano, seu transporte estacionará atrás de vocês em dez segundos – Rick avisava ao árabe.
– Entendido – Kashim respondeu ao abrir a porta do motorista e sair do carro.
“O garoto começava a irritá-lo com a porra daqueles codinomes” – o grego pensou.
– Fique abaixada – Kiron voltou a ordenar ao se mover para deixar o veículo –, podemos estar sendo seguidos – avisou.
Já do lado de fora, o árabe o encarou com uma sobrancelha erguida, em flagrante diversão.
– Leve a borboleta para o quartel general – informou entregando as chaves ao grego.
– Será feito.
Um carro, idêntico ao primeiro, estacionou atrás do veículo negro. O nórdico estava ao volante e o saudou com gesto de cabeça.
– Boa sorte! – o árabe comentou e seguiu em direção ao segundo automóvel.
– Vou precisar – Kiron resmungou e observou o nórdico colocar o carro movimento e virar na primeira esquina, desaparecendo de sua vista.
Kiron respirou fundo para acalmar sua testosterona e voltou para o veículo, entrando pela porta do motorista. Acabara de dar a partida no carro quando a voz da bailarina soou baixa e rouca atrás dele.
– Para onde irá me levar? – Isadora perguntou ainda deitada sobre o banco.
– Para um local seguro – ele respondeu ao colocar o automóvel em movimento.
– Onde? – Isadora perguntou mais uma vez.
Kiron expirou ruidosamente. Não tinha autorização para revelar para onde a estava levando.
– Saberá quando chegarmos lá – ele respondeu com a sinceridade que podia naquele momento.
Isadora respirou profundamente e reprimiu o protesto.
Sabia que poderia confiar nele, o homem salvara sua vida. E sua protetora família permitira que ele a retirasse do estacionamento. Além de todos esses motivos, ela sentia, com uma força descomunal, que esse homem daria sua vida para proteger a dela.
“Não que sua vida significasse algo para o agente de segurança. Mas ele tinha a alma de um soldado, e a honra era algo fortemente arraigado nesse homem” – reconheceu.
Convivera com soldados a vida toda. Não importava a profissão que Dante Tommazelli exercesse atualmente, ele já fora um soldado, ela tinha certeza, e em seu coração continuava a ser um.
O problema, para ela, era que, mesmo sabendo que tudo não passara de uma encenação para mantê-la segura, seu corpo ansiava quase que com desespero pelo toque e pelos beijos daquele homem.
A bailarina voltou a ficar em silêncio.
Kiron, atendo a direção, deu à Isadora o espaço e o silêncio que ela precisava.
Estava seriamente preocupado com os hematomas do braço e o ferimento em seu joelho. Existia a remota possibilidade de a circulação sanguínea do braço ferido ter sido comprometida pela força da pressão exercida pelo filho da puta que a machucara.
– Tudo aquilo não passou de encenação? – Isadora perguntou de repente.
A pergunta, que atormentava sua mente, escapou por seus lábios. Mas ela não se arrependia de fazê-la.
Pelo retrovisor do veículo, Kiron encarou a mulher deitada sobre o banco traseiro, pronto para proferir o discurso sobre segurança, minimizar riscos e outras merdas, mas as palavras não saíram. Não queria e nem conseguiria mentir para ela.
“Merda” – praguejou em silêncio e agarrou o volante com força.
– Então? – ela voltou a perguntar.
“A pequena bailarina mexia com fogo” – ele pensou.
– Preciso de um minuto – murmurou e desligou o comunicador sem esperar pela permissão para fazê-lo.
– O que quer saber, Isadora? – perguntou usando todo seu treinamento para se manter focado na direção.
Isadora cansou da posição incomoda, e mesmo contrariando as ordens dele, sentou sobre o banco de passageiro e o encarou pelo retrovisor.
– Fingiu estar atraído por mim? – perguntou mirando os olhos verde-acinzentados do agente de segurança.
– O que acha? – Kiron devolveu a pergunta.
Não se deu ao trabalho de manda-la se abaixar. Isadora não o obedeceria. Não até que uma maldita bala batesse contra os vidros blindados do carro.
O corpo dele queimava por ela.
Ela respirou fundo, desviou o olhar e voltou a encará-lo.
– Você salvou minha vida – disse. – Não estou chateada, entendo que tudo isso faça parte do seu trabalho e sinceramente agradeço por estar lá esta noite – usou toda a dignidade e coragem que ainda queimavam dentro dela.
– Mas... – ele a incentivou a continuar.
Isadora mirou o rosto esculpido com feições másculas e incrivelmente atraentes e respirou profundamente mais uma vez. Não era uma covarde, tampouco exporia seus sentimentos da forma que ele sugeria.
– O que seu coração diz, Isadora? – Kiron repetiu a pergunta, os sentidos focados na direção e na mulher atrás dele – Acha que sou tão bom ator assim? – mudou a pergunta.
“A pequena bailarina estava ferida, o vestido branco estava arruinado, os cabelos longos estavam uma bagunça, mas, para ele, não existia mulher mais desejável na face da terra” – Kiron admitiu.
“Porra! Estava muito encrencado!” – ralhou consigo mesmo.
– Não sei – Isadora confessou mirando os olhos intensos do agente –, me diga você – pediu em um sussurro.
Kiorn mandou ao inferno qualquer resquício de controle e, com uma manobra brusca, parou o carro.
– Por que parou o carro? – Isadora perguntou com o coração retumbando em seu peito.
Kiron não respondeu.
Com movimentos impacientes, ele soltou o cinto de segurança, desceu do automóvel, contornou-o e entrou pela porta de passageiro, batendo-a com força.
– Acredita mesmo que sou tão bom ator, Isadora? – perguntou ao mesmo tempo em que seu corpo avançava sobre dela.
Fascinada, Isadora contemplava o rosto másculo transfigurado pelo desejo. Estava em uma posição incômoda, meio deitada, meio sentada, mas o peso do corpo dele sobre o seu parecia perfeito.
O hálito quente do homem, que tinha a face muito próxima da dela, tocava sua pele, o olhar agora tinha um tom claro e vibrante de verde que roubava sua voz e sua respiração.
– Mikrúla mú – sussurrou em seu idioma natal e segurou a face feminina com ambas as mãos –, você é a maior tentação com a qual eu já me deparei na vida – ele confessou inconsciente de que pronunciara o termo carinhoso em grego.
Isadora quase perguntara o que significava as primeiras palavras que ele pronunciara, mas a proximidade, o cheiro e a promessa de beijos avassaladores, que enxergava nos olhos verdes, entorpeciam sua mente.
– Isso é ruim? – ela perguntou por fim e aproximou o face da dele.
– Muito, Isadora – Kiron respondeu sincero –, mas sou um homem perdido. Disposto a enfrentar as tormentas do inferno, somente para provar o seu sabor – murmurou mirando os lábios que prometiam o paraíso.
E mostrando o quanto eram verdadeiras as suas palavras, cobriu os lábios da bailarina com os seus.
Sentiu Isadora suspirar de prazer e agarrar-se a ele. O corpo rugiu de satisfação e prazer. Os lábios macios e quentes se abriram para ele em uma entrega doce que roubou o que restava de seu controle e razão.
“Mel! Isadora tinha o sabor do mel. Mas não o mel comum, o sabor dos lábios doces e embriagadores se aproximavam da descrição do sabor do Nectar dos Deuses” – Kiron pensava ao aprofundar o beijo.
Contava-se que a bebida mais antiga que o vinho, fora criada por Aristeu, filho de Apolo, tinha um sabor semelhante ao vinho, porém mais adocicado e apesar de não possui álcool em sua fórmula, embriagava os Deuses. Essa era a melhor maneira de descrever o sabor da mulher que suspirava entre seus lábios.
“Ele precisa de mais” – Kiron suplicou em silêncio ao puxar o corpo de Isadora para baixo do seu e deitá-la sobre o banco de passageiro. Todo o corpo dele rugia faminto e sedento por ela.
“Thée um! Nunca uma mulher tivera esse efeito devastador sobre ele!” – Admitiu ao deslizar as mãos pelo contorno dos quadris, cintura e continuar subindo até que ambas as mãos cobrissem os seios cheios e, mesmo cobertos pelo tecido do vestido, sentiu os mamilos enrijecidos clamarem por suas carícias, suplicarem por sua boca.
A resposta de Isadora fora apaixonada e encantadora, como ele suspeitava que seria. A ardente bailarina gemera alto e curvara o corpo de encontro ao dele, em silenciosa oferenda.
– Isadora – Kiron sussurrou e voltou a beijá-la com sofreguidão.
Uma necessidade ancestral os comandava com desespero e pressa.
Isadora o puxou ainda mais para ela, abraçou a cintura estreita com suas pernas e sentiu o corpo estremecer ao sentir o membro rígido e preparado contra o seu sexo, àquela altura, úmido pela luxúria que parecia consumi-la.
A boca masculina abandonou a sua e percorreu seu pescoço com beijos molhados e sensuais, que arrancaram gemidos sussurrados de sua garganta. Ao mesmo tempo as mãos grandes e levemente ásperas tocavam suas pernas e deslizavam, em carícias urgentes, em direção as suas coxas e continuaram subindo até agarrem o seu traseiro com vontade.
Ela gemeu de prazer, e em resposta o homem que roubara seu controle esfregava-se contra ela. A sensação de fricção quase a levara ao orgasmo.
– Dante – ela murmurou sexy, entregue, pronta para recebê-lo dentro de seu corpo.
Kiron sentiu como se acabasse de ser atingido pelo projétil de uma arma, tamanho o impacto que ouvir o Dante causara em seu corpo.
Interrompeu o beijo e encarou a mulher que roubara sua sanidade.
Pela primeira vez, ouvir um nome que não era o seu, provocara um buraco em seu peito. Uma sensação muito ruim e gelada percorreu seu corpo.
“Porra!” – Xingou. “Estavam parados no meio da rua, expostos a todo tipo de perigos, e se a pequena não tivesse sussurrado sua identidade como agente da Abaré, a teria possuído ali mesmo, dentro do carro. Merda!” – Praguejou.
Isadora o encarava atordoada com os olhos nublados pela paixão e os lábios inchados por seus beijos. E era a visão mais doce que ele já tivera na vida.
Por alguns segundos, somente as respirações ofegantes ressoavam no interior do automóvel. O momento de paixão e magia quebrados pela realidade.
“Precisava proteger a pequena bailarina, e não possuí-la como um homem louco, dentro de um dos carros da empresa” – Kiron admoestou a si mesmo.
Ele fechou os olhos, respirou fundo e voltou a encarar a mulher que o encara confusa e excitada.
– Preciso levar você para sua família, pequena – disse sem se afastar e acariciou a face de traços delicados, que a faziam parecer quase uma menina.
Pela primeira vez, a palavra pequena soou sensual nos ouvidos dela. Estava consciente de que estavam dentro de um automóvel, parados sabe Deus onde, mas nunca se sentira tão excitada e tão desejada em toda sua vida.
– E depois? – ela perguntou com olhos brilhando.
Kiron acariciou novamente a face morena, mas não respondeu.
Isadora lia a resposta nos olhos dele. Ele estava se despedindo, mesmo que não o dissesse.
– Nunca mais o verei, não é mesmo? – perguntou com o peito apertado, dolorido.
– Não sou o tipo de homem que precise em sua vida – Kiron comentou encarando a pequena bailarina.
Isadora sorriu da sinceridade do agente de segurança.
Não retrucou dizendo saber que não necessitava, mas que, talvez, desejasse um homem como ele em sua vida. Mas a verdade era que ela sequer sabia o que aconteceria em sua vida nos próximos dias, meses ou anos. Estava sob a mira de um bandido perigoso e não desejava arrastar o agente de segurança para essa bagunça.
– Adoraria ter conhecido você em outra situação – ela comentou acariciando a face masculina.
Kiron beijou a mão que acariciava seu rosto.
Ele simplesmente não conseguia dizer adeus.
– Vamos embora, seu pai e seus irmãos devem estar malucos – ele disse a ajudando a sentar e se recompor. – Preciso que fique abaixada, Isadora, e isso sério – pediu.
Ela sorriu mais uma vez.
– Pode deixar, agente, eu sei me comportar – respondeu, com um meio sorriso nos lábios.
Kiron respirou fundo, saiu do carro pela porta do passageiro e ligou o comunicador, antes que perdesse a cabeça e ferrasse com tudo de uma vez.
– Bem vindo de volta, Percy Jackson – a voz do geek soou no comunicador.
– Vá à merda, Saint Seya – ele resmungou ao abrir a porta do motorista.
Sem dizer mais nenhuma palavra, deu a partida e conduziu o veiculo rumo ao quartel general da equipe 1, o Santuário.
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Glossário:
Thée mu - Meu Deus
Yá ónoma tu Thée! - Pelo amor de Deus!
Mikrúla mú – Minha pequena.
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O que será que vem por aí?
Conto com seus comentários e estrelinhas!
Beijos
Nina Reis
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