domingo, 8 de novembro de 2015

A Vitrine - Capítulo 01


Leticia

Capítulo Um

O dia não começou nada fácil, o condomínio sem energia elétrica, tive que descer dez andares de saltos altos, como se só isso não bastasse, o trânsito estava completamente parado. Olho para o relógio – Putz! – Buzino na intenção de um milagre acontecer, estou atrasada, tenho uma reunião com Kevin há uma hora... atrás! Aquele americano não me engana, o tom de voz me diz que voltou de viagem com alguma ideia mirabolante, que provavelmente serei eu a responsável pela execução.

Estaciono meu carro na garagem do edifício da Global e saio em disparada para o elevador, como não posso fazer essa coisa subir mais rápido e nem posso me teletransportar, vou passando a lista de tudo o que tenho para fazer, coisas para fazer é o que não me falta.

Sou executiva com uma carreira meteórica, trabalhava para uma indústria de descartáveis em Minas Gerais e em uma feira de negócios, Kevin acompanhou de longe algumas negociações minhas, de oito contratos que eu queria para aquele dia, fechei doze. Pouco tempo depois entrou em contato comigo, oferecendo-me uma “nota preta” para trabalhar na Globalspace. Sempre fui muito grata a empresa que me deu a chance de desenvolver meu potencial e por essa gratidão, fiquei quase um mês pesando prós e contras. Mas aqueles que um dia me contrataram porque viram futuro em mim, disseram que não seria justo impedir-me de alçar grandes voos e me deram carta branca, então assinei contrato com Kevin. Um ano se passou, hoje, figuro entre os dez executivos mais importantes do país.

Ocupo um lugar onde os homens são maioria, ser de pele clara é quase uma regra, mas tenho orgulho em dizer, eu sou a contradição! Estudei muito, batalhei o dobro, para estar onde estou, nada veio de graça e nem na cama de ninguém. Minha pele é negra, meus olhos castanhos-amarelados se destacam, meu sorriso é minha marca. Para mim, sorrir, é o primeiro passo para ser feliz. Mas não meço palavras, todos sabem que não devem cruzar meu caminho, costumo ser amiga e não boba, é bom não confundirem.

As portas do elevador se abrem, no caminho para minha sala vou cumprimentado as pessoas que encontro, alguns se tornaram grandes amigos, outros se tornaram minha família. Assim que entro em minha sala, a secretária já vem em meu encalço – Letícia, o senhor Cooper está te esperando há quarenta e cinco minutos.

— Lorena, o mundo não está cooperando comigo, por favor, pelo menos você tem que me ajudar – Coloco minha pasta e minha bolsa em cima na mesa e já vou em direção a sala do Kevin.

Vi que há uma nova secretária para a presidência, qualquer dia desses tenho que perguntar para alguém o porque dessa rotatividade de morenas tipo dançarinas de funk nessa presidência. Aproximo-me da nova menina – Bom dia, tenho um horário com o Kevin.

Ela sorri como uma boneca... plastificada – Senhorita Letícia?

Assim que a moça termina de falar, o presidente da empresa sai de sua sala – Bom dia, Lê. Como está?

— Já tive manhãs melhores...
Ele estende seu braço para mim – Mandei preparar um café da manhã especial na sala de reuniões, venha.

O olho com descrença, não pelo café, mas pelo café na sala de reunião. Isso é uma tática que usamos quando temos negociações difíceis – É bom que esse café valha a pena, senhor presidente.

— Valerá, Lê.

Kevin tem por volta de quarenta e cinco anos, bem cuidado, pele clara, cabelos escuros, olhos verdes, alto, um corpo esbelto para idade e aquela barba bem cuidada o deixa muito charmoso. Sempre impecável na maneira de se vestir e no modo com que trata as pessoas, gentil e generoso. Sua esposa é uma graça, seus filhos não saíram diferente dos pais.

Entramos na sala de reuniões, que é toda em vidro transparente, no meio do décimo andar, como se fosse uma bolha, ao centro da sala há uma mesa retangular com doze lugares e um lindo café da manhã disposto. Kevin senta na cabeceira e Jônatas seu assistente, puxa a cadeira à direita para mim, uma das secretárias da diretoria entra para servir o café, enquanto me dizem o motivo dessa reunião.

É tanta coisa gostosa que perco até o foco, mas a curiosidade está me corroendo – Vai soltar a bomba agora no café ou vai esperar para o almoço?

— Preciso da sua ajuda com essa edição da vitrine.

Pego mais um croissant, mas dessa vez de chocolate – Você não me trouxe croissant de chocolate para pedir ajuda com a vitrine, é o meu trabalho.

Estou em uma briga ferrenha com o recheio, quando ele resolve falar – Quero que você seja a apresentadora dessa edição.

Sabia que tinha alguma coisa por trás desse café – Não acho que seja uma boa coisa, não sou a pessoa mais indicada para isso.

Ele leva a xícara a boca – Quando se trata de negociação, você é a melhor e realmente preciso da sua ajuda.

— Já te falei que não trabalho para o governo e nem com ele.

Kevin gira sua cadeira para ficar de frente para mim – A vitrine é um trabalho social para ajudar o seu país, trago grandes empresários para investir aqui. Você sabe disso, nos ajudou com algumas parcerias que não só abriram mais vagas de empregos como também pudemos ajudar toda a comunidade em torno dos projetos. Lembra daquele projeto que você insistiu que adicionar o orfanato que tinha ali perto? A empresa não só reformou como adotou e hoje aquele lugar é referência.

Agora o conterrâneo do Tio Sam pegou pesado, órfãos são meu ponto fraco. Perdi meus pais muito cedo, como ambos eram filhos únicos, fui morar com minha avó materna até que Deus a levou, eu tinha quatorze anos. Um casal amigo da vovó me acolheu por dois anos. Meus pais e vovó me deixaram alguns bens, uma conta que me ajudou com os estudos e de lá para cá venho me virando sozinha. Eu sei quanto é difícil não ter família, não ter um colo de mãe ou um irmão para implicar. Me lembro de ter chorado uma vez, minha vó disse que eu tinha que ser forte, porque a vida não seria fácil, então não me recordo da última vez que chorei.

Graças à Deus nunca tive dificuldades financeiras, consegui dobrar o patrimônio, vivi muito bem com o que me deixaram, até o dia em que conheci o João Paulo. Eu estava terminando a faculdade de Direito, uma romântica sonhadora, que fazia planos em se formar, casar, ter filhos, como qualquer pessoa que passou boa parte da vida sozinha. João Paulo era meu parceiro de estudos, estávamos sempre juntos, ele era lindo, loiro dos olhos castanhos, pele bronzeada, me conquistou com seu senso de humor.

Começamos a namorar, depois de alguns meses ele veio morar comigo, eu fazia tudo por ele, absolutamente tudo. No seu aniversário de vinte e sete anos eu dei o carro dos seus sonhos, como meu dinheiro era aplicado, tive que comprar financiado, mas qualquer sacrifício para o amor era válido, assim pensava eu. Uma semana depois o telefone tocou, um cara querendo os documentos do carro que ele havia comprado do João. Naquele momento percebi que não estava vivendo um conto de fadas e piorou no outro dia, depois de um dia exaustivo no estágio, passei no supermercado para comprar meu jantar e me deparei com uma cena de horror. Uma das caixas estava comemorando a gravidez, dizendo que o seu namorado comprou uma casa linda para morarem, inocente fui cumprimenta-la, fiquei tão feliz por aquela menina, até que a mãe do João entrou com uma caixa de presente linda com laço azul e entregou para a menina no exato momento em que ele, João Paulo, a pede em casamento para todos que estavam no mercado ouvirem. Meu mundo ruiu.

Eles não tinham me visto lá, eu precisava saber de toda a história e principalmente, precisava saber que casa. Fiquei esperando o mercado fechar e ela sair, ela me conhecia só que não sabia que meu namorado era ele. Convidei-a para jantar, ela aceitou e fomos para uma restaurante perto de onde estávamos. Em três anos do meu casamento, ele estava com ela há um ano, as famílias conviviam juntas, faziam planos para o futuro dos dois.

Meu Deus, até onde vai a maldade das pessoas? Engoli todo o ódio e a vergonha de ter fracasso. Perguntei da casa e ela detalhou a casa que terminamos de construir há poucos dias. Nós, não, eu construí, sozinha, um belíssimo sobrado em um bairro muito valorizado em Três Corações. Pensei seriamente que seria meu fim, doía tanto!

Corri para casa, eu tinha que encontrar os documentos que provavam que as minhas coisas, eram minhas e tive outra surpresa, do pouco que eu dividia com ele, nada mais era meu. Cogitei a ideia de me matar, de esperar ele chegar da suposta viagem e tirar tudo a limpo, mas para que tudo isso se a maior prejudicada seria eu.

Ele sabia da casa em que moramos e da que foi construída, a primeira estava em seu nome e a segunda no nome da garota grávida. Eu não sabia o que sentia, tinha vontade de morrer, de matar, de gritar, mas eu apenas chorava, passei uma noite inteira me lamentando, perguntando-me como nunca percebi, no fim das contas vi que não adiantava chorar, eu tinha que agir.

Eu não tinha muitas coisas para juntar, nunca fui uma pessoa de guardar lembranças, o pouco que tinha era o suficiente para mim. Arrumei minhas malas, reservei um hotel e comprei uma passagem para Belo Horizonte. A casa recém construída era financiada, se ele pagar, ficaria nela, caso contrário o banco tomaria. A casa que morávamos eu não pude fazer nada, mas tinha dinheiro o suficiente para mandar alguém fazer e mandei, não sobrou nada para lembrança dele.

Os dias que se seguiram, foram os piores da minha vida, trancada em um hotel, num lugar que não conhecia ninguém, sem vontade de sair na rua para caminhar, era só eu e eu, mais uma vez. Meu coração sangrava, perdi peso, me tornei um fantasma, estava à esperada de algo acontecer, seja para o bem ou para o mal.

Uma das camareiras do hotel sentiu pena de mim, ela trazia minhas refeições, falava sempre palavras de carinho. Com o tempo fui me abrindo e contando tudo o que vivi até ali, ela me abraçou enquanto eu colocava o resto das minhas amarguras para fora e tudo mudou quando ela disse – Agora que seu luto se dissipou, você pode voltar a viver. Você é mais forte do que pensa menina, chegou a hora de renascer.

Como se alguém tivesse ligado o interruptor da minha vida, eu renasci. Sai do hotel, aluguei um pequeno flat, conheci pessoas, distribui currículos e voltei a ser eu! Em poucos dias fui contratada para trabalhar no departamento de recursos humanos de uma indústria de descartáveis, fiz a prova da Ordem dos Advogados, peguei minha carteira e fui promovida pela primeira vez.

Usei o meu sofrimento para crescer, trabalhei meu psicológico ao máximo para que as más experiências não rejam minha vida e consegui. Hoje sou inteira, tenho as rédeas da minha vida, sou bem resolvida, sem ressentimentos, sem amarguras e sem um coração partido, esse último que não pretendo dar a chance de se arrebentar uma segunda vez.

Volto para a realidade e vejo o brilho nos olhos do meu chefe, aguardando a resposta – Eu vou Kevin, farei o meu melhor porque adoro um desafio. Mas não ouse usar os órfãos em chantagens futuras, já usou toda sua cota disso.

Jônatas coloca algumas pastas a minha frente – Aí estão todas as informações sobre os convidados, um mini dossiê para você se ambientar melhor.

— Vou apresentar projetos ou serei espiã?

Kevin coloca sua mão em cima da minha – Lê, obrigado por aceitar a participar desse projeto. Sei que você está cheia de compromissos e terá que abrir mãos de alguns para fazer isso. Vou te recompensar muito bem...

Dou duas batidinhas na mão dele – Meu querido, nada de recompensas, sou profissional demais para isso. Meus serviços têm preço, meus honorários são caros. Não vou só apresentar os projetos, vou convence-los de que o Brasil, mesmo em crise é um dos melhores lugares do mundo para investir. Já tem data marcada?

— O encontro acontecerá daqui dez dias.

— Será aqui no Rio mesmo?

— As negociações começam na quinta-feira e serão aqui sim. No sábado embarcam para Fortaleza para o final de semana, na segunda-feira almoçarão com a Presidenta, então voltaremos ao Rio para os acertos dos investimentos. Se tivermos algum interessado, claro.

— Que confiança, hein? Senti daqui a positividade – Pego as pastas e mais um croissant e vou para minha sala organizar meus compromissos. Não será fácil trazer os seis para cá, se eu conseguir pelo menos dois com esse cenário político, já ficarei satisfeita.

No meio tarde fiquei curiosa sobre meus convidados, abrindo a primeira pasta, começo a rir, um sheik de quarenta e cinco anos, com oito esposas. Investimento de risco é com ele mesmo.

Se os outros seguirem a mesma linha, será uma vitrine muito divertida, vou deixar para estudar as personalidades em casa, muita coisa para assimilar e várias estratégias a traçar.

Meu apartamento é o meu refúgio, aqui me sinto protegida do mundo. Escolhi um apartamento pequeno de dois quartos, bem aconchegante, localizado na Barra na Tijuca à beira mar. Tomar café da manhã com essa vista é maravilhoso, mas naqueles dias que o mundo está caindo nas minhas costas, ou quando acho que alguma coisa não tem solução, olho para o mar e percebo que para Deus não há limites, só o infinito e isso renova minhas forças.

Depois de uma semana exaustiva, sento no sofá ainda de pijama, com uma caneca de café na mão e olho as pastas que tenho que examinar. Venho adiando esse momento há dias, não sei porque, algo anda me incomodando, só não sei o que é.

Ouço três batidas e logo Lorena coloca seu rostinho de anjo na porta – Bom dia, Lê.

— Bom dia, Lolo. Que sacolas são essas?

— Nada demais, umas comidinhas para gente e uns docinhos para nos alegrar nesse final de semana de trabalho.

Lorena é uma moça linda, baixinha invocada, cabelos lisos pelo ombro, pele branquinha como neve, olhos castanhos, uma verdadeira boneca. Ela é daquelas pessoas que amam todo mundo, não vê o lado negativo de nada e nem ninguém, foi isso que me conquistou. Não me conhecia e mesmo assim abriu os braços como se se já me conhecesse a vida inteira.

Além de minha secretária é minha melhor amiga, desde que cheguei aqui ela e sua mãe me acolheram como se fosse da família. Ela tem a chave do meu apartamento, a única pessoa que confiaria isso. Depois que aquele namorado gigolô terminou o relacionamento, ela tem se refugiado no trabalho, então se ofereceu para me ajudar com esse projeto da Vitrine.

Abro a pasta do sheik – Olha isso, um sheik árabe, Hassan Mohamed Aziz Bashir, quarenta e cinco, seu patrimônio está avaliado em vinte e cinco bilhões de dólares, oito esposas, doze filhos e três netos. Investe em todos os ramos que desponta, de hotéis à clubes de futebol, seus hobbys... Fazer filho? Procurar outra esposa para o harém?

Lorena começa a rir – Olha a foto dele.

— Realmente o dinheiro é tudo nessa vida! Um homem baixinho, gordo e que usa vestido, não deve ser grande coisa na cama. Pela cara austera, não sorri muito, tempo com os filhos é o que menos deve ter, número de esposas é status. Ele não negocia com mulher, acha que fomos feitas somente para dar prazer... e filhos. Ele não se importa com os riscos, desde que tenha uma boa chance de retorno.

Lolo está me olhando de boca aberta – O que foi criatura?

— Como você sabe de tudo isso só olhando uma foto?

Dou de ombros, porque esse tipo de análise é fácil para mim, as imagens podem nos mostrar muita coisa –Ter oito esposas não é para qualquer um. Só em um país onde as mulheres não têm voz e vez, aceitariam ser mais uma na cama daqueles que deveriam as venerar como únicas.

— Verdade, mas na carência que ando, se um daqueles sheiks bonitinhos aparece por aqui, eu me jogo no harém sem problema nenhum.

Jogo uma bola de papel nela – Sua boba.

Ela pega a segunda pasta, tira a foto e me dá os outros papéis – Italianos, hum. Esses homens foram criados para o pecado, delícia.

— Menos hormônios, Lolo. Esse italiano, é Martino Nicolazzi Rossi, quarenta anos, seu patrimônio está avaliado em treze bilhões de dólares, uma esposa e cinco filhos, outro que investe em vários segmentos. Envolvido em escândalos com prostitutas de luxo, modelos, atrizes, vidinha bem agitada. Deixa eu ver a cara do sujeito.

Esses italianos têm um charme especial, eles podem não ser lindos, mas esse “jeito italiano” de ser é o suficiente para cair em escândalos com eles. Lorena me tira do devaneio – Está babando no italiano, não é? Eu sabia que não iria resistir também.

— Esse será um dos investidores, com as armas certas somos capazes de fazê-lo não só construir um hotel, mas também investir em outros empreendimentos. Percebeu como ele é parecido com aquele jogador italiano Buffon? Muito “nham nham”.

Pego a terceira pasta e abro, um calafrio percorre meu corpo e quando focalizo aqueles olhos azuis, meu coração falha uma batida. Rapidamente fecho e jogo a pasta em cima da mesa.

— O que houve, Lê? Está pálida, está sentindo alguma coisa? – Ela senta ao meu lado e abraçando-me – Que tal voltar para a cama, minha flor?

— Não foi nada, só um mal estar. Vamos continuar a conhecer os bofes endinheirados?

Ela sorri – Vamos!

Alcanço outra pasta e abro com cuidado – Muito interessante, grego, quarenta e dois anos, esposa e três filhos, seu patrimônio é de aproximadamente dezoito bilhões de dólares, seu ramo de investimentos é a hotelaria. Sebastian Khristophoros, erradicado nos Estados Unidos há mais de vinte anos, ele compra hotéis de médio e grande porte que estão à beira da falência e os transformam em cinco estrelas, ele não costuma mudar o nome dos estabelecimentos, aqui diz, que prefere manter a tradição de cada casa.

Olho para Lorena que está quase tendo um orgasmo com a foto do grego na mão – Ele é bonito assim, Lorena?

Ela joga a foto no meu colo, me deparo com um verdadeiro Deus grego – Para de babar, Letícia – Ela ri.

Não posso deixar de constatar o fato em voz alta — Ele é lindo!

— E gostoso... e rico... e comível. Ai, ai...

— Negociar com gregos não é fácil, está na mesma linha do sheik.

— Deixa que a Lolinha aqui negocia com o bonitão.

Paramos para almoçar e descansar um pouquinho, cada pasta aberta, anotações são feitas, saber algumas características é fundamental quando pretendemos negociar com grandes cacifes.

Passamos a pasta de um empresário americano que já tive a oportunidade de conhecer, Ethan Scott, trinta e cinco anos, solteiro disputadíssimo nos Estados Unidos. Olhos azuis, uma boca perfeita, barba rala, cabelos bem curtos, seu corpo parece ter sido esculpido, é um verdadeiro atleta e muito arrogante. O conheci em uma feira na Argentina, o cara adora um rabo de saia, não pode ver uma brasileira que já se assanha, acha que o mundo gira em torno do seu umbigo, mas compensa com seu bom humor. Seu patrimônio gira em torno de treze bilhões de dólares, seu principal ramo de investimentos é a Construção Civil, tem participação na sociedade de grandes marcas mundiais e não abre mão de brincar na bolsa, o que já lhe deu perdas de patrimônio e ganhos incalculáveis. Segundo a Lorena, seu futuro marido.

Liam Larkin, irlandês, trinta e nove anos, viúvo e sem filhos. Seu patrimônio é de vinte bilhões de dólares, seu ramo de investimentos é basicamente hotelaria, turismo e bebidas. Ele tem participação em várias indústrias cervejeiras e de várias bebidas em todo mundo. Um ruivo de olhos verdes, com aparência doce, parece ser uma pessoa tolerante, não perde a calma muito fácil e há uma pontinha de tristeza. Tristeza não, solidão. Lorena também vai casar com ele e trazer mais cor a sua vida, como sonha.

Já era noite quando terminamos de organizar um arquivo sobre o encontro, já estava guardando a papelada quando Lorena fala – Esquecemos de um, gato, Zachary Thorton O´Brian, americano, trinta e nove anos, divorciado, sem filhos, com um olhar de fazer qualquer mulher ovular e uma boca desenhada para o pecado.

— Passa-me somente a ficha, por favor. Aqui diz que seu patrimônio é de trinta e um bilhões de dólares, empreendedor nato, compra empresas falidas, faz prosperar e vende pelo dobro do preço, não tem um segmento prioritário, aqui está listada empresas e marcas do mundo todo que ele possui participações. Esse sem dúvida não seguirá com as negociações, na melhor das hipóteses, ele ficará só tempo de terminar a apresentação dos projetos.

— Você já viu a foto dele? “Jesus-Luz” me abane.

— Lolo, estou bem cansada, vamos deixar o resto para outro dia. Que tal um filme?

— Aproveita e faz pipoca com chocolate, creusa, eu ficarei por aqui admirando meu futuro marido número três, Zachary.

— Doida.

No meio da noite tive um sonho estranho, estava em um local escuro, vestido de festa, caminhando sozinha. Sentia alguém me observando, olhava para os lados, mas só via escuridão. De repente sinto meus cabelos da nuca arrepiarem, um arrepio estranho que me percorrer, olho para trás e encontro somente um par de olhos azuis escuros, quase violetas. Fiquei paralisada, o medo não me permitia mexer. Uma voz disse para correr, me livrar daquele olhar, eu queria correr, sair dali, mas eu não tinha forças, porque aqueles olhos me hipnotizaram e estavam cada vez mais perto. Com a aproximação o ar ficou frio, meu corpo em alerta e ele cada vez mais perto, eu queria gritar, pedir socorro, até tentava, só que nada acontecia. Quando ele chegou a minha frente, meu corpo ficou mole, ele vai me matar...

Acordei em um sobressalto, a televisão ligada, Lorena deitada do meu lado, o dia quase amanhecendo. Fui até a sala, peguei a bendita pasta, sentei, respirei fundo e abri, pronta para confirmar que já tinha visto aqueles olhos dos meus sonhos, mas para minha surpresa, não era. Tinha uma outra foto, outros olhos, remexi a pasta inteira, será que eu estou ficando louca? Eu tinha certeza que... Devo estar trabalhando demais.

Visto uma roupa de ginástica, o tênis e fui correr na praia, espairecer desse sonho louco. Durante a corrida fico tentando entender a loucura de ontem à noite. Eu tinha certeza que os olhos do sonho eram os mesmos que tinha visto na foto, senti até o mesmo calafrio. É muita loucura para uma pessoa só

Chego no apartamento e sinto um cheirinho de café, ah, que delícia. Se eu ficar muito tempo com areia na pele, me dá coceira, então vou direto ao quarto para tomar banho. Lavo-me, coloco roupa e vou para a cozinha, encontro a mãe da Lolo fazendo tapioca. Abraço-a bem apertado – Bom dia, tia, madrugou?

— Bom dia, Lê. Já são dez horas da manhã. Liguei mais cedo para a Lorena e ela disse que você tinha saído para correr, eu sei que a senhorita só corre quando está com problemas, então vim fazer um mimo para minhas meninas.

Abraço-a mais forte – Longe de mim reclamar, tia. Adoro quando você vem aqui, mas não estou com problemas, só a cabeça cheia, por causa dos projetos mirabolantes do Kevin.

Lolo senta em outra cadeira – Mãe, depois do café vou mostrar para a senhora seus três futuros genros – Comecei a rir, essa menina é demais.


E assim foi meu domingo, tranquilo, com a família, recarregando as energias para mais uma semana de batalha. 

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