domingo, 29 de novembro de 2015

A Vitrine - Capítulo 04

Capítulo Quatro

Letícia

Fico estática, sinto o calor tomar conta e a minha pele queimar. Viro-me mais devagar possível.
— Desculpe-me essa é uma reunião particular, só para convidados...
— Senhor Zachary Thorton O´Brian. — Lorena corre para corrigir meu deslize. — Essa é a executiva que será a oradora dessa edição, Le...
— Letícia, eu sei. — Ele termina a frase de Lolo.
Fico muda, chocada, de boca aberta, pasma, descrente e todos os outros adjetivos cabíveis e possíveis.
Aquela boca deliciosa continua a se movimentar e dessa vez faço um esforço para ouvir.
— Então Letícia, me acompanha?
Claro que sim!
— Lorena o fará, com licença.
Viro-me e vou para onde minha mesa está arrumada e me preparo para começar a apresentação, mesmo sem jeito. Kevin se coloca ao meu lado e dá início a reunião.
— Sejam bem-vindos a sexta edição da Vitrine. Fico honrado por terem aceitado nosso convite para estarem presentes. Espero que os projetos apresentados alcancem os gostos de alguns e assim poderemos concretizar fortes parcerias. Deixo vocês agora com a competente Letícia, que fará a apresentação dos projetos.
Em meio aos aplausos, tomo meu lugar e começo minha jornada.
— Obrigada senhor Cooper e boa tarde a todos. É um prazer tê-los aqui...
— O prazer é todo nosso, signorina. — O italiano com um sorriso galante fala.

O infeliz do Zachary olhos azuis, se sentou de frente para mim, ele está em linha reta de onde estou. Deus, agora sou eu que preciso da sua proteção. Como posso me concentrar em frente a um loiro, alto, com olhos azuis intensos e detestavelmente lindo? Cabelos compridos bem cortados um pouco abaixo do ombro, barba rala e estrategicamente mal feita contornando aquela boca que com toda certeza, foi desenhada para o pecado, lábios finos repuxados em um sorriso de canto. Jesus, ele é parecido com Jesus... E que Jesus, Xesus!
Ele tira seu terno e a sua secretária, o pega. Pacientemente, ele dobra as mangas, abre mais um botão da camisa, recosta-se para trás com aquele sorriso sarcástico nos lábios.
— Gostou senhorita Letícia?


Só então me dou conta de que assisti o showzinho de boca aberta. Sacudo a cabeça para desanuviar e começo meu discurso.
— A frente de vocês há uma pasta para que acompanhem as apresentações, quaisquer dúvidas que possam ter, estejam à vontade para perguntar a qualquer momento.
Olhar diretamente nos olhos das pessoas é um ponto a favor de quem está negociando, isso mostra força e determinação. Tento olhar a cada um, mas quando chego a Zachary, desvio, aquele olhar é hipnótico.
Faço um sinal para ligarem o retroprojetor.
— Nosso primeiro projeto é uma empresa de software. Dois jovens desenvolvem aplicativos de trabalho para smartphones, eles adaptam a funcionalidade de cada unidade e tipo de serviços.
Foram quatro horas seguidas e três projetos transmitidos, cada detalhe esboçado e explicado, perguntas sendo feitas, discussões sobre ideias florescendo. Até aqui tudo absolutamente perfeito! Agora é hora de dar um tempo para respirar e descansar.
Pego um copo de suco e vou para a sacada ver a praia, essa cidade é linda tanto de dia quanto a noite e o som do mar, acalma-me. Movimento meu pescoço em círculos, meus ombros doem, a tensão é grande.
— Uma massagem pode ser uma boa saída agora.
Olho para ver o irlandês gato escorar-se no parapeito da sacada. É impossível não sorrir para ele, Liam é diferente, emana paz.
— Não seria nada mal.
— Você foi muito bem Letícia, foi imponente com o sheik. A hora que você falou sobre o aplicativo para organizar as visitas das esposas, não pude me conter. Ri muito.
Entreguei o copo a um dos garçons e pedi outro suco.
— Ele se mostrou difícil o tempo inteiro, chegou uma hora que foi impossível de continuar.
Ele se aproxima e seu braço encosta no meu.
— Você é muito persuasiva, Letícia, o modo de apresentar e dar ideias para incrementar, faz toda a diferença.
— Obrigada senhor Larkin...
— Chame-me de Liam, gostaria de jantar comigo mais tarde, Letícia?
— Não, ela não gostaria Larkin. — Zachary me entrega um copo. — Seu suco. A agenda da nossa executiva prodígio está lotada, não é mesmo Letícia?
Pego o copo.
— Não, não está cheia e será um prazer jantar com você Liam.
Nisso Kevin aparece na sacada.
— Letícia. Encerraremos por hoje, retornaremos amanhã a partir das dez da manhã. E mais uma coisa, parabéns. Você foi magnífica.
Aceno para ele com sincera gratidão.
— Obrigada, senhor Cooper.
Saio para encontrar Lolo e a encontro de cochichos com Ethan.
— Você me empresta ela, Ethan? Obrigada.
A puxo dali antes que ele tivesse tempo para alguma reação.
— Agora que o papo estava ficando quente.
Faço uma careta e ela volta a olhá-lo.
— Foco Lorena! Preciso de um favor.
— Meus ouvidos são todos seus Lê...
— O senhor Larkin me convidou para jantar. Eu não ia aceitar, mas o Zachary apareceu e acabei aceitando.
— Zachary. Sei... — ela me olha com um sorriso debochado.
— Mui amiga senhorita Lorena. Poderia correr no meu apartamento e pegar roupas para mim? Eu deixei um conjunto branco em cima da cama, tenho quase certeza que deixei peças íntimas que combine com a roupa no mesmo lugar. A minha nécessaire está no banheiro, lá já tem tudo o que eu preciso para higiene e não esqueça do meu perfume, aquele do vidro rosa em formato de flor, é mais fraco, perfeito para a manhã. Ah, não esqueça de trazer um pijama.
— Vou num pé e volto no outro Lê.
— Obrigada.
Lorena passa por Ethan que a segura, ela fala algo e os dois olham para mim, ele sorri e faz sinal de positivo com o polegar na minha direção. Ah, não, o que ela falou?

——ooOoo——

— Nossa mesa está esperando, Letícia. — Liam toca meu braço com delicadeza. — Vamos?
Examino o salão para ver se tudo está em ordem. Quase todos os convidados já se recolheram aos seus quartos, sobrando apenas Zachary e Ethan confabulando em um canto, alguns de nossos assistentes estavam organizando as coisas para a reunião pela manhã e o lindo irlandês esperando-me para jantar.
Fomos até um dos melhores restaurantes da cidade que fica no próprio hotel. Nos levaram até uma mesa de canto, onde poderíamos ter um pouco de privacidade.


Liam é um cavalheiro, seu sorriso aquece meu coração, muito doce.
— Fico feliz que tenha aceitado meu convite Letícia. Fiquei encantado com esses olhos, há momentos que parece amarelo ou dourado, como olhos de gato.
— Obrigada, mas falar assim me deixa pouco à vontade.
— Não pude deixar de perceber que seu inglês é perfeito e pelo modo com que fala, deduzo que já morou na América. — ele segura meu olhar.
— Fiz um curso de Relações Internacionais durante três meses lá. Os melhores dias da minha vida e desde então, sempre que tenho folga, é para lá que vou.
Meu sonho era conhecer Nova York, andar pela Quinta Avenida e trabalhar na Wall Street. Para mim, Letícia, esse é o ápice que um executivo pode alcançar: Ser bem-sucedido na capital do mundo.
Há alguns anos atrás fiz inscrição para um curso de extensão em Harvard, sem pretensão alguma. Na verdade, na minha pobre concepção, era só pelo prazer de que tinha boas notas para tentar, só por isso fiquei uma semana com um sorriso besta no rosto.
Então, em um belo dia recebi uma carta de uma das instituições de ensino mais importante do mundo, dizendo que fui aceita para fazer o curso de Relações Internacionais. A alegria era tão grande que chorei e pensei nos meus pais, eles estariam orgulhosos da filha que tinham.
Estariam...
Naquele dia, fui até Kevin, decidida a pedir demissão para fazer o curso, eu iria para os Estados Unidos de qualquer maneira. Ele não somente me apoiou como exigiu que eu me hospedasse em seu apartamento. Era pequeno, mas muito bem localizado. Lorena embarcou comigo nessa jornada estudantil, aprimoramos nosso inglês, até porque saímos daqui só sabendo o básico para comer, egg, milk, water, bacon e bread. De fome ninguém morreria.
Bons tempos, bons contatos e ótimos passeios. Jurei a mim mesma que um dia moraria lá e estou no caminho de adquirir meu primeiro imóvel em Nova York, mas especificamente de frente para o Central Park.
Com a crise lá, os valores dos imóveis despencaram e Kevin acha que está na hora de se desfazer do apartamento, logo farei minha proposta para comprá-lo. Nesse meio tempo, também descobri que adoro a bolsa de valores, aprendi como jogar e não é que deu certo? É meu passatempo preferido. Ninguém sabe que tenho um bom dinheiro, nem mesmo a Lolo. Mas posso me dar o luxo de fazer o que bem entender na vida. Sou sozinha, não sei se terei a oportunidade de ter filhos e quando chegar minha hora de partir dessa vida terei a certeza de que aproveitei tudo o que quis. Tudo bem que se o Kevin me vender o apartamento serei pobre novamente, mas uma pobre em Nova York!
 O garçom se aproxima e tira-me do devaneio, fizemos nosso pedido e ele se retira. De repente, todo ambiente muda, o restaurante fica em silêncio.
Ouço risadas, olho para minha esquerda e ele estava lá, muito próximo da sua assistente, aliás, até onde pude perceber a única mulher entre quatro homens que vieram na delegação dele.


Zachary não é um tipo comum, os traços delicados contrastam com a força. O seu olhar é forte e sua boca, seus lábios finos, o deixa ainda mais poderoso.
— Pelo jeito Zach está aproveitando a viagem. — Liam fala.
— O hotel é lindo, a cidade é maravilhosa, seria um pecado vir ao Rio de Janeiro e não aproveitar.
— Vocês se conhecem há quanto tempo?
— O conheci hoje. — essa conversa não está indo para um bom lugar.
— Interessante. Tive a impressão de que se conheciam há mais tempo.
Aonde o irlandês gostoso quer chegar? Arrumo-me na cadeira, e cruzo minhas mãos no colo.
 — Todos são cheios de impressões e achismos.
— Talvez. —Liam olha além de mim e fala. — Zachary é um daqueles tipos que se devem ter distância. Ele não se importa de passar por cima de tudo e de todos para conseguir o que deseja. Ele é bom colega, mas no que se refere às mulheres e aos negócios, ele é implacável. Gostaria de saber por que ele não tira os olhos de você.
— Porque sou a hostess mais sexy que já tiveram ou talvez seja apenas o fato de um milionário jantar com uma pobre mortal. — Meu coração bate um pouco mais forte que o normal e controlo-me ao máximo para não me certificar de que ele está falando a verdade. Prefiro só dar uma resposta e mudar de assunto.
Liam solta uma risada deliciosa.
— Você é mortal, mas não nesse sentindo — Ele pisca para mim, levando-me a sorrir também.
Depois do jantar, estávamos parados em frente aos elevadores, assim que a porta se abre Lolo sai.
— Já ia te procurar, Lê. Suas coisas estão na suíte, aqui a chave. — Ela me dá um abraço. — Desculpa, mas tenho um compromisso.
Não deu tempo nem de agradecê-la, pois ela saiu apressadamente. Estranho. Algumas pessoas entraram conosco no elevador, o que o deixou cheio de mais, Liam ficou ao meu lado, mas um pouco mais a frente.
Quem se colocou atrás de mim, ficou próximo demais. Não precisei olhar para quem era, eu já sabia, reconheceria esse perfume em qualquer lugar.
Meu coração acelerado não estava me ajudando, passei a mão no pescoço, o desconforto estava grande. Fechei meus olhos e tentei não respirar, porque ele mexe com algo em mim que não entendo.
— Espero que o casal tenha tido um bom jantar. — sua voz reverbera pelo meu corpo, fazendo os cabelos da minha nuca se arrepiar.
— Nosso jantar foi excelente, Zach e pelo visto o seu também. — Liam responde.


— O meu foi prazeroso, Larkin.
O elevador para no meu andar e saio sem dizer uma palavra a ninguém e assim que as portas fecham solto minha respiração que nem tinha percebido que estava segurando. Corro para a segurança da suíte, preciso tomar um banho, relaxar e pensar.
Já deitada, peço para a recepção passar a ligação para o quarto do Liam, foi muita falta de educação da minha parte fugir daquela maneira, ele merecia uma explicação.
— Suíte do senhor Larkin. — Um homem atende.
— Boa noite, Liam se encontra?
— Neste momento ele está em videoconferência, gostaria de deixar recado?
— Poderia dizer que a Letícia ligou para dar boa noite? Obrigada.
Viro para o lado e fecho os olhos na intenção de dormir. O que demora a acontecer e logo aquele espetáculo de homem, com aqueles olhos azuis figuram no palco do meu sonho, fazendo-me despertar ofegante.

Eu não sei como isso é possível e não faço a menor ideia do que está acontecendo comigo. Mas de uma coisa tenho absoluta certeza, tenho que me afastar de Zachary Thorton O´Brian, senão, ele será minha sentença de morte!

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