Capítulo Quatro
Noah
Quando saí do banheiro, juntei minhas roupas e fui para a cozinha. Assim
que entrei, dei de cara com Alyssa comendo um grande sanduíche. Minha barriga
ronca de fome.
— Eu quero também.
— Senta, eu faço - ela aponta uma banqueta.
— Senhores, deixem que eu faça... - uma das empregadas, aparece.
— Não – Alyssa aponta para ela — Está na hora do seu descanso. Nós nos
viramos.
— Da última vez tive problemas, Alyssa. Não quero correr riscos – a
mulher sorri para minha irmã com afeto. Ela fala baixo, quase não ouço — Não
posso me dar ao luxo de perder esse emprego.
— Teve problemas com o que? – curioso, pergunto. A mulher empalidece
nitidamente e olha para Alyssa em busca de socorro.
— Sua namorada tem aterrorizado os empregados, ameaçando-os de demissão,
caso não sejam como os empregados da realeza. Ela quer ser servida como as
madames da grande sociedade.
— Sério? Até hoje não entendi porque tenho tantos empregados. Mal fico
em casa.
— Pois é – Alyssa se concentra em passar mostarda no pão e a mulher me
olha apreensiva.
— Como é seu nome mesmo? – pergunto para a mulher.
— Rosa, señor.
— Rosa, bonito nome. Ainda sou o dono da casa e Alyssa é minha irmã,
fazendo dela tão dona quanto eu. Então, vá se deitar e tenha um bom sono – falo
sorrindo.
— Gracias, señor – ela se vira
e vai.
— Quando nós viramos uns riquinhos de merda? – volto a olhar minha irmã.
— Não sei – ela ri — Lembra da casa do Chris? Eles sempre foram podres
de rico, mas a mãe dele sempre os fizeram tratar todos, independente, de serem
empregados ou não, igualmente. Acho que foi isso que o levou a ser político.
— Pode ser. Eu o encontrei hoje no clube. A cara dele não estava nada
boa – falo.
— Quer um refrigerante? – aceno que sim e ela pergunta — Quer mais um
sanduiche?
— Quero. Eu nem sabia que estava com fome.
— Estou sabendo que o Chris está tendo dificuldades para aceitar que,
ser político e trabalhar como ele quer, terá que fazer, sacrifícios – fala
concentrada em seus afazeres.
— Que sacrifícios?
— O casamento com a Audrey, por exemplo – ela me entrega o lanche — O
noivado deles foi marcado para daqui há três meses e o casamento as vésperas
das eleições.
— Está brincando... – engasguei-me. Ela balançou a cabeça.
— Bem que eu queria. Eu achava que ele amava ela, formam um casal
perfeito e fora que ela é um amor.
— Ele gosta dela, só que não é amor para um casamento. Se conheceram no
Ensino Médio, flertaram por um bom tempo e só assumiram um compromisso depois
de muito tempo – explico.
— Está muito ocupado amanhã?
— Nada muito importante, posso me dar ao luxo de sair a tarde – olho-a —
O que tem em mente?
— Queria ir aquele restaurante pequeno lá na saída da cidade.
— Esteja no meu gabinete às onze. Obrigado pelos sanduíches. Senti falta
de estar com você, pequena – Levanto da cadeira, beijo-a.
— Eu também – ela sorri e ajeita seus óculos que atualmente é rosa.
No caminho para o quarto, desvio-me indo para o de hóspedes e adormeço.
Desperto com os gritos da Carly vindos de algum lugar, que eu não faço questão
de saber. Vou para o meu quarto, tomo banho, coloco um terno preto e uma camisa
preta, porque esse é o meu humor. Gosto de usar meu cabelo bagunçado, quando
estou em casa nem penteio, mas para trabalhar, tenho que enchê-lo de gel e
penteá-lo para trás. Desço e vou para a cozinha tomar café. As pessoas que
trabalham aqui, ficam me olhando, até Martha entrar e falar:
— O que está fazendo aqui, Noah? Seu café foi servido na sala de jantar
como a senhorita Porter pediu.
— Bom dia para todos – abro meu terno e sento em uma das banquetas. Eles
me respondem “bom dia” em uníssono — Então, a partir de hoje, tomarei meu café
aqui, todos os dias. Nada daquelas frescuras, quero um café da manhã normal,
torradas, ovos mexidos com queijo e bacon, café forte e uma fruta...
— Eu surtando por causa do seu desaparecimento e você aqui com os
empregados – sou interrompido por Carly — Faça-me o favor, Noah, onde já se viu
o patrão tomar café na cozinha com os empregados? Você tem que parar com essas
manias de pobre.
— Logo pela manhã, ninguém merece – esfrego minhas têmporas com os
dedos, fecho os olhos e respiro fundo algumas vezes. Abro-os e volto minha
atenção para Carly — Quem você pensa que é para falar assim comigo, na minha
casa? Eu faço o que bem entender, se quiser, comerei na garagem e você não tem
nada haver com isso. Outra coisa, sei que você anda passando essas ideias
ridículas de serviçais para os meus funcionários aqui de casa e vou lhe dar um
conselho, não faça isso. Eu a convidei para vir morar comigo porque achei que
seria uma boa ideia tê-la por perto, ajudar na administração desse museu de
casa. Mas hoje, eu tive a certeza de que errei feio. Então, Carly, não me faça
arrepender de estar com você e para com esses gritos, são irritantes – volto-me
para Martha — Você é a governanta, você decide sobre tudo quando se tratar da
administração desse lugar. Qualquer dúvida ou decisão, cabe a mim e na minha
ausência, Alyssa.
— O que? – Carly surta novamente e grita — Está me desautorizando na
frente deles? Enlouqueceu?
— É melhor você pensar nesse showzinho que você está dando, porque eu
não suporto e os empregados não tem porque ficar ouvindo seus ataques
histéricos também – levanto e encaminho-me em direção a garagem.
— Desculpa. Na próxima vez...
Eu a corto.
— Não haverá uma próxima vez, Carly. Tenha um bom dia.
— Noah – ouço alguém me chamar antes de entrar no carro. Martha vem
correndo com a minha pasta e uma pequena sacola — Sua pasta. Você não comeu
nada, meu filho. Preparei uma coisinha para você.
— Obrigado, Martha. Fui claro agora pouco?
— Como água – ela balança a cabeça.
— A partir de agora, ela é uma mera convidada com privilégios e mandar
na minha casa, não é um deles. Tenha um bom dia, Martha.
Alguns dias passam e para variar, Carly dá um de seus chiliques logo
pela manhã. Deus sabe o esforço que tenho feito para levar esse relacionamento
a diante, mas ela não está ajudando e minha paciência está no limite. Não sou
do tipo que desiste fácil das coisas e acredito que ela esteja passando por um
mal momento. Seja o que for, tem que passar logo!
Ligo o som do carro bem alto para aplacar minha indisposição matinal e
pelos altos falantes, soa Welcome To The
Jungle do Guns N´ Roses – “Bem-vindo à selva”! Trilha sonora
perfeita para enfrentar o trânsito de Nova York. Toda vez que fico parado no
congestionamento, pergunto-me porque raios me mudei para aquela casa.
No caminho para o gabinete no centro de Nova York, deparo-me com uma
cena curiosa. Dois policiais cercando uma mulher, que está com as mãos
levantadas e um homem muito maior que ela no chão. Eu não sou de me meter, mas
algo me fez parar. Encosto o carro e vou de encontro a eles, aproximo-me e dou
de cara com a ruiva do clube.
— O que está acontecendo aqui, oficial? – falo olhando para ela.
— Bom dia, meritíssimo. Essa mulher estava agredindo esse homem – um dos
policiais responde.
Olhei para o cara estatelado no chão e tive que conter o riso. Ele era
maior que eu e apanhou da ruiva insana. Olho para ela e balanço a cabeça.
— Por que você agrediu ele?
Como nunca reparei nessa mulher antes? Fico deslumbrado com o corpo
dela, que está vestida com uma calça jeans muito justa, botas de saltos altos,
uma blusa que nos dá a dimensão exata dos seus fartos seios.
— Dá para olhar para os meus
olhos, majestade?
— Petulante. E a forma correta de tratamento, é excelência – falo sério.
— Posso pelo menos baixar os braços, mister excelência? Estão ficando
doloridos – aceno que sim.
— Agora me responda – falo aproximando-me do cara no chão.
— Ele estava me seguindo – ela revira os olhos, fazendo-me ainda mais
irritado e ela conta sua história — E resolveu me atacar a essa hora da manhã.
— Vocês viram o cara atacando ela? – pergunto para os policiais.
— Não – eles respondem ao mesmo tempo e o policial estranho continua —
Apenas vimos ela com o pé no pescoço dele...
— Ah, pelo amor de Deus – ela fala mais alto do que deveria — Acham
mesmo que saio por aí espancando as pessoas sem razão?
— Tudo indica que sim – respondo.
— Esqueci que estou falando com a voz da verdade da cidade Nova York, o
Todo-Poderoso juiz Lancaster – ela fala colocando as mãos na cintura.
— Eu posso mandar lhe prender por desacato, mocinha – digo aproximando-me
dela.
— Você não faria isso. Sabe que eu não bateria de graça nesse cara – ela
aponta para o cara do chão.
— Não sei, não a conheço – esse jogo está deixando-me excitado e essa
língua afiada está me irritando.
— Mas é muito arrogante mesmo – ela está indignada.
— Senhorita, você está presa – olho para os dois policiais — Prendam-na,
autuem e a levem para o tribunal hoje à tarde para que eu possa lhe atribuir
uma pena ou o valor da fiança.
— Sério? Eu vou ficar com a ficha suja na polícia, por socar um
perseguidor?
— Sim, vai – chamo um dos policiais de lado, enquanto o outro a leva
para o carro — Eu não acredito que ela agrediu ele, sem uma boa motivação. Mas,
não é certo que ela ande por aí, achando que pode resolver as coisas no braço.
Não façam sua ficha, mas a levem ao meu gabinete para que eu lhe atribua uma
pena.
— Concordo, excelência – o policial sorri discretamente — Eu também
acredito na moça, mas ela é muito agressiva. Tivemos que pedir para colocar as
mãos para cima. Poderíamos ser os próximos a estar no chão.
— Eu entendo. Bom, tenha um bom dia – aceno em compreensão.
Entro no carro e sigo para o gabinete rindo, a mulher é maluca. Ela
conseguiu deixar um cara de mais ou menos uns cento e trinta quilos desacordado
no chão. No carro, tenho a opção de ligar apenas com comando de voz, que faço
assim que estou parado no semáforo.
— Bom dia, Ben.
— Bom dia, Noah – ele atende-me com voz de sono.
— Acabei de ver a barmaid do
clube aqui na rua. Ela conseguiu espancar e desacordar um cara que é o dobro do
tamanho dela.
— Ela está bem? – sua voz fica mais aguda — Merda, Madison. Ela sabe que
deve ligar para alguém, ou mesmo um dos seguranças quando tiver problemas.
Mulher teimosa.
— Ela foi detida e prestará trabalhos comunitários – conto.
— Isso é necessário, Noah?
— Foi necessário. Porque ela é atrevida e agressiva. Vai ter um tempo
para pensar no que fez.
— Ok – ele começa a rir — Já viso de antemão, ela vai transformar a sua
vida em um inferno.
— Isso é o que veremos. Até mais – despeço-me.
— Até.
Estaciono na minha vaga e vou para o meu escritório. Repasso algumas
coisas com a secretárias e com dois dos meus assistentes. Debruço-me sobre um
caso muito complicado, de uma mãe que está sendo acusada de mandar matar o
próprio filho e que vai a júri popular, para piorar, o advogado de defesa é
Benjamin. Ele é um dos melhores criminalistas do país, não é de se surpreender
que tenha sido contratado para esse caso. A hora passou rápido e uma assistente
entra:
— Senhor, há policiais aqui com uma detenta, dizendo que tem uma reunião
hoje.
— Pode mandar entrar – tento disfarçar um sorriso, quando Madison passa
pela porta com os dois policias atrás dela. Aponto-lhe uma cadeira.
— Sente-se, senhorita? – o policial entrega sua ficha e fiquei surpreso
quando vi que é totalmente limpa — Então, Madison Aria Harver, você não pode
sair por aí batendo nas pessoas...
— Ele estava me perseguindo... – ela interrompe-me.
— Vamos direto ao ponto, Madison. Os policias e eu achamos que você é um
tanto agressiva e precisa melhorar esse seu comportamento. Então, vou
atribuir-lhe como uma pena alternativa, servir o Judiciário de Nova York,
trabalhando nesta comarca como assistente, das dez da manhã às cinco da tarde,
durante quarenta dias, sob meu comando e sob a supervisão da Harriet, chefe do
gabinete.
— Não. Obrigada, majestade – ela levanta.
— Você tem duas opções – recosto-me e faço uma careta — É isso ou a
cela. Você escolhe.
— Começo quando? – ela senta-se novamente.
— Amanhã. Aproveite seu último dia de folga e por favor, não espanque
mais ninguém. Tenham um excelente dia.
Ela abre a boca para contestar e acaba a fechando novamente. Isso será
muito divertido, ter a senhorita atrevida aqui ao meu dispor. Quem sabe eu não
a convenço de que a violência descabida, não leva a nada. Também posso saber
detalhes dessa terapia do amor, que ela tanto prega.
Assim que eles saem pela porta, ouço a voz de Alyssa:
— Madison? Oh meu Deus. O que
está acontecendo? – ela entra no meu gabinete, um pouco pálida — Por que ela
está com esses policiais? Você não...
— Madison vai te contar o que houve, enquanto faço algumas ligações –
levanto-me, vou até ela e beijo-lhe a testa.
Vejo as duas se sentarem na sala de espera, fecho a porta do meu
escritório e volto para os meus afazeres. Ter essa ruiva aqui pode até ser engraçado,
mas gostosa do jeito que a desgraçada é, não será fácil evitar de tentar
come-la.
— Noah falando – meu telefone toca, tirando-me do delírio e atendo sem
olhar o identificador.
— Amor, por favor não fique bravo comigo – Carly no telefone chorando.
Por mais cadela que seja a mulher, qualquer mulher, vê-las chorarem, acaba
comigo. Como não me compadecer da mulher que mora comigo?
— Calma. Não chora, ok? Mas, Carly, você tem que repensar seus atos,
senão, esse relacionamento estará fadado ao fracasso.
— Eu sei. Desculpa-me!
— Tudo bem. Nos vemos mais tarde.
— Não virá para casa, mais cedo? – fala com aquela voz de manhosa, que
tem me irritado.
— Tenho compromisso, Carly. Até mais tarde.
— Era a sua namorada se lamentando? – olho para cima e vejo Alyssa
entrando na minha sala.
— Era.
— Olha Noah, o que importa para mim, é a sua felicidade – ela se senta à
minha frente — Se ela te faz feliz, então eu farei de tudo para aceita-la
também. Mas não vou mentir, está difícil. Admiro por você ser um homem que leva
os relacionamentos a sério e por tentar fazer isso dar certo com a
desiquilibrada da Carly. Eu andei olhando alguns apartamentos e achei um que
cabe no meu bolso e estou pensando...
— Você não vai se mudar, Alyssa.
— Noah...
— Não, e assunto encerrado. Vamos almoçar.
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